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23 de abril de 2024

Manual de sobrevivência de china


Por Rafael Donadio / Coluna "Ao pé duvido" Publicado 12/06/2019 às 19h30 Atualizado 22/02/2023 às 22h04
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Manual de Sobrevivência Para Dias Mortos. O nome do quinto trabalho da carreira solo do pernambucano China já diz muito sobre as 11 faixas que o compõe. Lançado no último dia 31 de maio, pelo selo Pedra Onze, o disco é uma resposta aos tempos distópicos que o Brasil se aprofunda.

Aos 40 anos, China não abre mão das programações e samples, do uso de órgão e micromoog ou da proximidade com o pop e a música brasileira em geral. Mas, nesse novo álbum, o artista também recorre aos tempos em que integrava a banda Sheik Tosado, que, no Manguebeat, no fim dos anos 1990, chegou com sonoridade agressiva, misturando frevo e maracatu com hardcore e metal.

É o que podemos perceber mais nitidamente na parceria do pernambucano com o guitarrista do Sepultura Andreas Kisser, “Frevo e Fúria”, que fecha o disco. Invocando as influências da juventude, China dá seu último recado de luta e rebeldia de Manual: “É proibido pensar, falar, informar / É proibido pensar, calar, se esquivar / É proibido dizer, querer se envolver / É proibido viver, nascer, morrer (…) Tudo que me resta é sobreviver (…) Pra depois deixar sangrar, gritar, se rebelar.”

Mas voltemos ao início. Na faixa “Vivo?”, o compositor destaca, de forma muito direta e precisa, o despreparo e a brutalidade policial: “A violência cospe bala e sangue / Outro corpo caiu no canal / A polícia vai brincando de deus / Nesse inferno subtropical.” São letras como essas, simples e sem desvios, que norteiam todo o trabalho. Fáceis, inclusive para leitores de WhatsApp.

A base de instrumentação do disco são sustentadas pelo trio China (sample, programação, baixo, órgão e voz), Lucas dos Prazeres (percussão) e Yuri Queiroga (micromoog, baixo, guitarra, sample e programação). Queiroga também assina a produção, enquanto Buguinha Dub assina a mixagem e masterização.

Em “Moinhos de Tempo”, a também pernambucana Bell Puã se junta a China e dá o recado, enquanto Queiroga constrói um cenário caótico de guitarras distorcidas: “Pernambuco dos brabo não tem rabo preso, ninguém sai ileso dos versos que não tem cabresto.” Bell continua rimando e cutucando os cidadãos de bem: “Século XXI e branco insistindo em ser neonazista / fazem rebuliço só de pensar que Jesus podia ser negro, que dirá uma preta contrariando estatística?”

China também assume o retrocesso e reconhece o ser humano como “um processo que evolui para trás”, mas, mesmo em tom pessimista, continua com ânimo e esperança para se fortalecer, na faixa “O Selvagem”: “Vamos lá retroceder porém render-se jamais.”

Em Manual, o artista equilibra bem a porrada com a calmaria. Depois de três músicas mais pesadas e com letras incisivas, há um respiro de fé e tranquilidade em “Ofertório”. Pede iluminação, proteção e que os pés não cansem de seguir. E com o hardcore “Fascismo Tupinambá”, continua dando recado simples e claro: “Fascista, cidadão de bem, tabacudo, vai tomar no c..”

A força e iluminação pedida em “Ofertório” é retomada na letra de “Entre Coronéis”. Mais uma vez, o nordestino aceita a situação sombria do país para buscar forças: “Enfrentar qualquer perigo / Coragem para mudar / Pelos olhos do destino / Coragem para mudar / Tudo é uma questão de se manter alerta e vivo (…) Viver como água sempre se adaptando.”

Assim como todas as outras letras, “Consumo” é um reflexo da sociedade: “A propaganda diz num apavoro que ter já vale muito mais que ser (…) Você vale o que consome / nem um centavo a mais / Você sabe que o seu nome / não vale nada demais.”

“Pó de Estrela” não é a última música do disco, mas é para essa que acabo sempre voltando depois da fúria do frevo. Ao lado da paranaense Uyara Torrente (A Banda Mais Bonita da Cidade), China coloca, com muita profundidade e beleza, o amor como alternativa de se viver em dias mortos. Felizmente, ainda é possível dizer que refletimos compaixão, afeto e carinho, entre tantas porradas e obstáculos.

Manual de Sobrevivência Para Dias Mortos conta ainda com a gravação dos músicos André Oliveira, João Figueiroa, Buguinha Dub, Rodrigo Sanches e Guga Fonseca. Participação Neilton e Natália Matos. A fotografia da capa do disco é de Pamella Gachido. Projeto gráfico de Elza Silveira, com encarte inspirado em antigos documentos do DOPS.

Foto da capa: Pamella Gachido

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