Sozinho, sim, mas junto de alguma forma


Por Victor Simião

Não vou criar provas contra a pessoa, mas preciso dizer: uma amiga saiu do isolamento social e me visitou. Tá, não foi bem uma visita, mas foi ótimo. Em tempos como o nosso, trocar olhares pessoalmente equivale ao abraço que dávamos poucos meses atrás. E tenho a certeza de que, nos cinco minutos que ficamos juntos, sorrimos muito, mesmo que de máscara. Há feições que não se pode esconder. A visita foi ontem, quinta-feira (25), para celebrar um motivo especial – não, ainda não temos um ministro da Saúde. E sim o meu aniversário.

Amanhã, sábado (27), faço 26 anos. Honestamente falando, não queria completar mais um ciclo em meio à pandemia. Uma amiga bem disse, aliás, que, em razão do que temos passado, não poderíamos ficar mais velhos. Como o tempo é relativo, sei que eu, ela e a Glória Maria concordamos nisso. Agora, vá dizer isso a um garoto que tem 17 anos e está louco pela maioridade para poder fazer tudo que já faz, só que sem o medo de ser descoberto e com a possibilidade de ouvir Bruno e Marrone em alto em bom som dirigindo o carro do pai dele. Ou então tente dizer isso para uma garota prestes a fazer 15 anos, que, em muitos casos, celebra com um evento especial, mesmo que simples, reunindo amigos que em cinco anos ela nunca mais verá e pouco interagirá nas redes sociais. Festa, aliás, que sempre tem aquela música do Bruno e Marrone sobre ser pai. Festa, aliás, que nem sabemos se poderá ser feita neste ano.

Pensando em tudo que me aconteceu entre junho de 2019 e junho de 2020, muita coisa mudou. Pessoas saíram, pessoas chegaram, minha birra com o Tiago Iorc continua. É o ciclo da vida. Mas há aqueles que sempre ficam e que não são pais, irmãos ou boletos. No caso aqui são os amigos. É neles que tenho pensando mais constantemente. Em todos eles.

Em anos anteriores, fazer aniversário era sinônimo de festa durante uma semana. Bar do Zé, Tabuleiros, Divina Dose, Atari, casa de um, casa de outro. A data era uma desculpa para celebrar a vida, contar histórias, poder abraçar. O melhor presente era ter a certeza da amizade. Atualmente, devido à Covid-19, nada disso será possível, e sinto uma pontada de tristeza por isso – mas isso não é sintoma da doença, fique tranquilo.

Ao mesmo tempo, a visita de minha amiga na quinta, as mensagens que já tenho recebido, os encontros que estão sendo marcado para depois da pandemia, tudo isso me consola, mostrando que tem gente que gosta da gente – das piadas ruins, inclusive. Mesmo distantes, estamos próximos.  

Amanhã, ao acordar com 26 anos, eu estarei fisicamente sozinho. E aí vou me lembrar de cada uma dessas pessoas que não preciso nomear aqui. Ao pensar nelas, no que vivemos e ainda vamos viver, darei um sorriso que, embora ninguém veja, aquecerá meu coração. É por isso que, na hora que lavar o meu rosto mais velho, olharei no espelho – ainda sorrindo – e direi para mim mesmo: sozinho, sim, mas junto de alguma forma.

“É por isso que, na hora que lavar o meu rosto mais velho, olharei no espelho – ainda sorrindo – e direi para mim mesmo: sozinho, sim, mas junto de alguma forma”, escreve o cronista. Na imagem, o autor aos quatro anos de idade (Foto: Arquivo Pessoal/Victor Simião)
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