Cota na USP: análise racial de estudantes muda e será feita apenas virtualmente


Por Agência Estado

A Universidade de São Paulo (USP) anunciou que vai mudar a forma de fazer a checagem racial de candidatos cotistas aprovados no vestibular da Fuvest que se autodeclaram pretos e pardos, após o atual método ser questionado e alvo de judicialização por parte de estudantes que tiveram a matrícula barrada este ano.

O novo formato propõem que estudantes que ingressarem pela Fuvest (vestibular da própria USP), e que não forem aprovados na primeira etapa de verificação fenotípica (análise de foto), sejam submetidos a uma avaliação virtual pela comissão de heteroidentificação, substituindo o encontro presencial previsto no antigo regimento.

A mudança vai uniformizar a análise dos candidatos cotistas autodeclarados pretos e pardos. Isso porque os estudantes que ingressam pelo método do Enem USP e pelo Provão Paulista já realizam essa segunda fase da análise por meio de uma oitiva virtual. Antes, somente os inscritos na Fuvest faziam a entrevista presencial.

“A principal novidade deste ano é a uniformização do processo para todas as formas de ingresso – Fuvest, Enem USP e Provão Paulista. Após a análise das fotografias feitas na primeira etapa da averiguação, comum a todos os candidatos pretos e pardos, os candidatos não aprovados serão convocados para uma oitiva virtual”, disse a USP, em nota.

“No ano passado, a existência de dois modelos de entrevista – presencial para a Fuvest e virtual para a o Enem USP e o Provão Paulista – levou a questionamentos e judicializações por parte de alguns candidatos”, completou a universidade.

Regulamentado no dia 10 de julho após aprovação do Conselho de Inclusão e Pertencimento (PRIP) da USP, o novo método, porém, não deve eliminar a possibilidade de novos questionamentos e alegações de distorções.

Este ano, estudantes cotistas aprovados no vestibular chegaram a ter a matrícula barrada pela Comissão de Hetoidentificação após serem avaliados justamente pelo método de entrevista virtual. Segundo a entidade, eles não apresentavam as características fenotípicas de uma pessoa negra.

Um dos casos foi o do estudante autodeclarado pardo Alison dos Santos Rodrigues. Aprovado em Medicina, ele foi descrito pela banca avaliadora como uma pessoa “de pele clara”, “boca e lábios afilados” e que o “cabelo raspado” do jovem impedia a bancada de identificá-lo como negro.

Dos Santos acionou a Justiça contra a universidade e conseguiu o aval para se matricular e participar das aulas.

– De acordo com a USP, no vestibular de 2024, das 11.147 vagas oferecidas pela universidade, 2.067 foram reservadas para candidatos autodeclarados pretos, pardos e indígenas (PPI), em todos os cursos de graduação. Deste grupo, 2.076 estudantes foram avaliados pela Comissão de Heteroidentificação, que considerou 1.827 candidatos habilitados, 204 não habilitados – 45 desistiram do processo.

O reitor da USP, Carlos Carlotti Junior, disse em nota que o modelo “não-presencial de entrevista é o ideal”. Mas em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, em março, chegou a afirmar que pretendia alterar o sistema de análise fenotípica dos candidatos cotistas prevendo que todas as entrevistas passassem a ser feitas de forma presencial, e não mais virtual.

“É mais barato arcar com o custo das viagens do que deixar qualquer dúvida no ar e expor a instituição”, disse Carlotti Junior, na época.

Seu posicionamento atual sobre a entrevista não presencial é outro. “É nossa meta implementar políticas que busquem garantir a diversidade na USP, dialogando sempre com a sociedade e fazendo os ajustes necessários. A partir da experiência adquirida, considerando as experiências de comissões de heteroidentificação de outras universidades e instituições, a universidade concluiu que o modelo não-presencial de entrevista é o ideal”, afirmou Carlotti Junior após a aprovação do novo modelo.

Ana Lúcia Duarte Lanna, pró-reitora de Inclusão e Pertencimento, afirma que a Comissão de Heteroidentificação da USP, “atende às demandas dos movimentos negros” que tem se mostrado um instrumento que “garante que as vagas sejam ocupadas, efetivamente, por candidatos pertencentes ao grupo de pretos e pardos”.

“A análise dos candidatos segue critérios fenotípicos como cor da pele e outras características físicas associadas ao preconceito racial”, disse Ana Lúcia.

Como funciona o processo de identificação?

– Primeira etapa do processo de averiguação é a análise das fotografias dos candidatos – obrigatória a todos os que se autodeclararam pretos e pardos;

– A avaliação é feita por uma das duas bancas responsáveis por essa etapa, cada uma composta por cinco integrantes – um docente, um servidor técnico-administrativo, um aluno de graduação e um aluno de pós-graduação.

– Se o candidato não for aprovado, as fotografias seguem para verificação de outra banca, que faz a avaliação sem saber da reprovação anterior.

– Os candidatos que também não forem aprovados pela segunda banca são convocados para uma oitiva virtual. Nesta etapa, o candidato deverá ler uma autodeclaração de pertença racial, que será gravada e avaliada por uma nova comissão, composta por cinco integrantes.

– Nos casos em que, mesmo após a oitiva, a inscrição for indeferida, o candidato ainda tem a oportunidade de apresentar um recurso ao Conselho de Inclusão e Pertencimento (Coip) que poderá, caso haja a necessidade, realizar novas oitivas virtuais.

Sair da versão mobile