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18 de maio de 2024

Como dar um feedback sem destruir a identidade de uma pessoa?


Por João Ricardo Tonin Publicado 08/04/2024 às 16h50
 Tempo de leitura estimado: 00:00
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A palavra “feedback”, de origem inglesa, combina os termos “feed” e “back”, unindo os princípios de fornecer uma avaliação de algo que já ocorreu. Foto: Reprodução/Pixabay

A comunicação permitiu, ao longo da história, que o ser humano pudesse compartilhar conhecimentos, coordenar ações em grupo, desenvolver a cultura e estabelecer uma sociedade complexa. Nossa natureza, por sua vez, gera em nós um desejo intrínseco de explorar, inovar e melhorar continuamente. Essa necessidade acaba por se tornar o combustível do progresso.

Assim, se a comunicação e a vontade de mudança são características primordiais da vivência humana, é natural que tenhamos um forte desejo de ajudar alguém a crescer e se desenvolver, fazendo isso, na maioria das vezes, por meio do feedback.

A palavra “feedback”, de origem inglesa, combina os termos “feed” e “back”, unindo os princípios de fornecer uma avaliação de algo que já ocorreu. Ele se popularizou nos processos de Recursos Humanos na última década. Outra característica natural do ser humano é o julgamento.

Mesmo não sendo especialistas em algo, com base em nossas vivências, frequentemente proferimos algum ponto de vista. Esse comportamento também é entendido como uma forma do ser humano compreender o mundo ao seu redor e sentir-se parte da sociedade em que vive.

Se você frequentemente se comunica, julga e oferece feedbacks de forma automática, não se preocupe, pois está agindo conforme sua natureza intrínseca. Outras características que nos diferenciam dos animais são: a autoconsciência e o raciocínio abstrato. Isso nos leva a concluir que, é muito saudável as vezes abandonarmos as nossas reações automáticas para permitir que nosso lado mais evoluído tome a frente.

Empregar nossa autoconsciência para evitar falhas é uma estratégia muito eficaz. Uma técnica popular para isso é a de apontar e verbalizar o que observamos. Um exemplo clássico dessa prática pode ser observado durante o embarque em um avião, quando ouvimos piloto e tripulação anunciando verificações como “checagem de portas concluída” em voz alta.

Contudo, surgem momentos em que nosso subconsciente nos pressiona a fornecer feedback a alguém sobre algo que, paradoxalmente, nós mesmos precisamos urgentemente implementar. Essa contradição pode parecer hipócrita à primeira vista. Nessas situações, é sempre importante avaliar se o que estamos recomendando é algo que fazemos com uma certa frequência.

Fazer uma recomendação é algo simples e racional: “faça isso e obterá aquilo”. No entanto, surge a questão: por que muitas vezes essa recomendação não se aplica a nós? A resposta é simples: Falar é fácil, o difícil é colocar em prática. Implementar efetivamente um feedback exige muito mais do que simplesmente compreender o conceito. Demanda uma introspecção profunda, impactando nossa parte emocional, nosso autoconhecimento e autocontrole, e podendo até mexer com nossa identidade.

No senso comum, a identidade é concebida como o modo pelo qual a pessoa se percebe e é percebida pelos outros. Ela engloba um conjunto de qualidades individuais, crenças, valores, experiências e cultura. Segundo James Clear, autor do livro “Hábitos Atômicos”, a identidade é moldada por uma série de hábitos cultivados ao longo da vida. O autor adiciona ainda que a formação de um hábito é sempre motivada pela expectativa de uma recompensa, sugerindo que mesmo os hábitos considerados ruins oferecem algum tipo de gratificação.

Assim, se alguém adota um determinado comportamento, está, de certa forma, obtendo uma recompensa por agir assim. Permita-me ilustrar isso com um exemplo que pode esclarecer melhor a ideia. Imagine que você tem dois colegas de trabalho: o primeiro é despretensioso em seu vestir, desleixado com a barba e o cabelo, e tende a apresentar uma postura relaxada; o segundo, por sua vez, é impecável com seu cuidado pessoal, sempre trajando roupas de grife e mantendo seu penteado impecável, ainda que isso possa transmitir uma imagem de arrogância.

Um dia desses qualquer, enquanto você está na cozinha, se depara com ambos e sente uma vontade incontrolável de oferecer feedbacks. Sem conhecer a identidade única de cada um dos amigos, você imediatamente comenta com o primeiro que ele transmite uma imagem de descuido e diz ao segundo passa uma imagem de arrogância. Na sua mente, fornecer essas observações irá aprimorar a maneira como os demais enxergam cada um deles, o que, por sua vez, poderia gerar efeitos extremamente benéficos no contexto profissional.

No entanto, como bem diz o senso popular: cada moeda tem dois lados. Antes de oferecer feedback a cada um, se você questionar qual o benefício que eles visualizam em manter essas características pessoais, descobrirá que o primeiro valoriza uma aparência mais descompromissada por acreditar que isso transmite uma sensação de acessibilidade, enquanto o segundo considera que a apresentação pessoal reflete o zelo e a dedicação que aplica em suas atividades profissionais.

Apesar de sempre existir espaço para aprimoramento, independentemente de nossas ações ou da posição que ocupamos, às vezes um feedback precipitado pode comprometer a identidade de alguém e desprovê-lo do que mais valoriza. No cenário que descrevi, se seus amigos associassem seu sucesso profissional à imagem que projetam, um comentário mal-calibrado poderia deixá-los desorientados ou até mesmo diminuir sua motivação no trabalho.

Uma vez, acompanhando minha esposa em um estudo acadêmico, acabei envolvido em um cerimônias do chá, uma prática popular na cultura asiática. Enquanto desfrutava de chá e bolinhos (que não me recordo o nome), uma frase ficou gravada na minha mente: “as palavras são como flechas, uma vez disparadas, não podem ser recolhidas”. A partir deste dia, aumentei o cuidado com as palavras que saem da minha boca.

Para causar um impacto significativo na vida de alguém por meio de feedback, é essencial expressar com entusiasmo os benefícios reais que uma mudança de comportamento pode trazer. Em muitos casos, é válido apelar para o lado emocional, como por exemplo, ilustrar o tempo adicional que alguém poderá desfrutar com a família ao completar suas tarefas mais rapidamente e sair mais cedo do trabalho.

Para oferecer feedback de forma eficaz, sem comprometer a identidade de quem o recebe, é essencial compreender genuinamente a motivação por trás das ações daquela pessoa. Além disso, é crucial avaliar o impacto real do feedback, ponderando se vale a pena investir energia em questões que geram retornos mínimos e exigem mudanças substanciais.

Na visão comum, a melhor forma de dar um feedback para alguém é através do exemplo, muitas vezes dispensando a necessidade de uma comunicação formal. Considerando que você leu este artigo até aqui, permita-me oferecer um feedback: que tal escrever um artigo sobre um tópico de seu interesse também?

Obrigado e um forte abraço.

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