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07 de maio de 2024

‘Foi desafiador, mas posso dizer que venci’, diz mãe que levou filhos para faculdade para conseguir terminar curso


Por Victor Ramalho Publicado 07/05/2021 às 12h25 Atualizado 24/02/2023 às 20h06
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Durante a faculdade, a jornalista Célia Martinez (foto) levava os filhos Caio e Victória, à época com 5 e 2 anos de idade, respectivamente, para as aulas | Foto: Arquivo Pessoal

Toda maternidade impõe desafios para a vida de uma mulher. Ser mãe vai muito além de se tornar responsável por outra vida, significa também tirar forças – muitas vezes de onde não se imaginava ser possível – para superar todas as dificuldades. O amor aos filhos não é só sentimento, é combustível para driblar todas as pedras pelos caminhos da vida. 

E sobre superar adversidades a jornalista Célia Martinez, de 43 anos, entende muito bem. Hoje graduada e trabalhando com comunicação há mais de uma década, ela relembra seu período de faculdade quando precisou se dividir entre ser acadêmica e, ao mesmo tempo, mãe de dois filhos. Na época em que ainda estudava jornalismo, entre 2010 e 2013, a profissional precisou, por diversas vezes, levar os pequenos Caio e Victória, à época com 5 e 2 anos, respectivamente, para as aulas junto com ela, por não ter com quem deixá-los. 

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Célia relata que foi um período bem desafiador da vida. Com problemas familiares e no casamento, ela se dividia entre o emprego, a maternidade e os estudos. “Eu estava vivendo um momento bem turbulento da minha vida e no meu casamento. Então, todo o apoio que meu ex-marido estava dando no começo, que já era pouco, ele começou a não querer apoiar tanto. A forma dele de me atingir era afetando com a faculdade, e o modo dele interferir nos meus estudos era dizer que não iria cuidar dos filhos naquela noite. Me lembro que teve um dia que eu tinha prova, ele chegou e falou que não iria cuidar das crianças naquele dia, pois tinha um compromisso. Nesse dia, precisei levar eles comigo”, afirma.

Por já ter uma graduação anterior em Letras, Célia lembra que conseguiu eliminar algumas disciplinas nos dois primeiros anos de curso, o que ajudou a conciliar melhor todas as obrigações. Mesmo assim, era uma rotina difícil. A jornalista relata que, durante a faculdade, perdeu o pai, vítima de câncer, e com a família morando em outra cidade, encontrar alguém para cuidar das crianças era um grande desafio. Levá-las para as aulas junto com ela foi a única alternativa.

“Durante a faculdade, perto do fim do curso, meu pai acabou falecendo. Minha mãe mora em Nova Esperança [a 40 quilômetros de Maringá]. Os pais do meu ex-marido às vezes me ajudavam, quando eu tinha algum trabalho importante e não podia levar as crianças, eles ficavam com elas, mas não era sempre, pois eles moravam longe. A logística ficava ruim, não conseguia tempo hábil até sair do trabalho, chegar em casa, pegar eles para levar aos avós e depois ir para a aula. Muitas vezes eu ficava impossibilitada por conta do tempo que eu tinha, então eu preferia levar comigo do que ter que levar para alguém cuidar. Próximo do final do curso, eu até contratei uma babá, mas também não era sempre que ela podia ficar com eles. Eu dava meus pulos [risos]”, relembra.

“Para as crianças, era como se fosse um passeio”

A jornalista também comenta sobre a relação que tinha com os filhos durante esse período. De acordo com ela, como as crianças ainda eram muito novas, elas não tinham muita dimensão do que estava acontecendo. Mesmo assim, a mãe fazia de tudo para tornar a experiência o mais agradável possível.

“Elas eram muito pequenas, então não tinha muita ideia do que ocorria. Para elas, era divertido. Imagine, para duas crianças, em vez de ficar em casa, à noite, em um apartamento, elas saíam comigo, iam para as aulas. Na instituição, tinha um parquinho onde elas ficavam brincando. Às vezes, até algum professor meu ficava nesse parquinho com as crianças, olhando para mim enquanto eu fazia alguma prova. Então elas não sentiam tanto, era como se fosse um passeio, elas adoravam. Eu tentava fazer aquilo não se tornar um fardo para eles, tornar a experiência agradável, para não estressá-los. Já era ruim para mim, eu me sentia super mal por isso. Toda mãe carrega esse sentimento de culpa”, confessa.

Além das aulas e provas na instituição de ensino, Caio e Victória também acompanhavam a mãe em atividades fora da faculdade. “Jornalismo é um curso muito prático. Sempre que tinha que fazer alguma gravação externa, ir para algum lugar tirar fotos, alguma atividade na rua e eu não tinha com quem deixar, levava eles comigo”, explica.

“Estudar e trabalhar, para a mulher que tem filhos, tem que ter muita garra. Eu acordava muito cedo, nessa época eu já trabalhava com TV e você sabe: repórter não tem horário. Então eu acordava muito cedo pra fazer entrada ao vivo, tinha que deixar o almoço pronto, então dormia muito pouco. Eu tinha que conseguir conciliar faculdade, trabalho e ser mãe. Era um curso com muitos trabalhos práticos, que demandavam tempo, mas eu sempre dava um jeito”, diz Célia.

Próximo ao fim da graduação, Célia se divorciou do ex-marido. Mesmo assim, ela seguia firme em seu objetivo: se graduar em jornalismo e poder proporcionar uma boa vida para os filhos.

O papel dos professores

Os docentes tiveram um papel fundamental na trajetória da comunicadora no ensino superior. Segundo ela, os professores prestaram um apoio incondicional não só com os conteúdos, mas também com as crianças. “Eles foram muito parceiros, entendiam completamente o que eu passava e tenho muita gratidão por todos eles. Eu me lembro que eu tinha uma professora, a Valdete, que inclusive foi minha chefe na TV durante muito tempo, que quando eu tinha prova, ela levava meus filhos pro parquinho e ficava lá brincando com eles, era muito divertida. Até hoje ela brinca, dizendo que meus filhos são os ‘sobrinhos’ dela”, relata. 

A empatia dos professores, na visão dela, permitiu que ela conseguisse seguir a graduação, mesmo com todos os desafios. “Tinha dias que eu chegava neles e falava: ‘Olha, não consegui concluir o trabalho, me dê mais uma dia’. E eles davam, sempre foram muito compreensivos nesse sentido, porque sabiam que eu não fazia de propósito. Claro que eu sempre me esforcei, ao máximo, para cumprir todos os prazos, fazer todas as atividades, mas nem sempre era possível. Por isso, agradeço a compreensão deles nesse sentido”, acrescenta.

“Desistir é uma palavra que não existe para mim. Hoje, eu posso olhar para trás e dizer que eu venci”

Foram quatro longos anos, várias noites sem dormir e se dividindo em três para dar conta de ser, ao mesmo tempo, profissional, estudante e mãe. Mesmo com tudo isso, Célia garante que nunca pensou em desistir da faculdade por causa da maternidade.

“Nunca [pensei em desistir], acho que essa palavra é muito forte e não existe em meu dicionário. Eu acho que nunca podemos abandonar um objetivo, dizer que não pode ser concretizado, até esgotarmos todas as alternativas possíveis e eu sei que, mesmo passando por tudo aquilo, mesmo sendo difícil e cansativo, ainda era algo possível de ser alcançado. Eu tive um chefe na TV que, quando uma pauta minha não dava certo por algum motivo, às vezes algum entrevistado que eu não conseguia, ele dizia que eu ‘havia desistido muito cedo’. Tomei aquilo como ensinamento, eu não iria desistir da graduação até esgotar todas as minhas chances. Foi exatamente o que eu fiz”, comemora. 

Companheiros de jornada, os filhos Caio e Victória estavam lá quando a mamãe, enfim, se formou. “Eu fiz questão que eles participassem de tudo, estavam lá comigo, na cerimônia, talvez eles nem lembrem, eram pequenos ainda, mas estavam lá. Uma professora até brinca dizendo que eles se formaram em jornalismo também, só não pegaram o diploma”, afirma Célia.

Os filhos estavam lá quando Célia concluiu a graduação | Foto: Arquivo Pessoal

Após superar todos esses desafios, a jornalista afirma que ainda hoje tira lições importantes daqueles momentos vividos. Ela ressalta a importância dos filhos em sua vida e garante que, se fosse necessário, hoje passaria por tudo novamente.

“Meus filhos são a razão da minha vida. Na minha listinha pessoal da vida, me formar em jornalismo era uma de minhas metas. O Caio e a Victória foram um combustível para isso. Eu fiz por eles, fiz para poder proporcionar uma vida digna para eles. Hoje eu posso olhar para trás, relembrar tudo isso e dizer que eu venci, hoje eu posso dar uma vida para meus filhos e isso só foi possível porque lá atrás eu precisei dar meus pulos, me virar. Não foi fácil, mas eu tenho certeza que, se fosse necessário, eu passaria por tudo de novo”.

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