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19 de maio de 2024

Saiba como é a vida das mulheres presas na região de Maringá


Por Evandro Mandadori Publicado 16/04/2022 às 11h15 Atualizado 20/10/2022 às 18h54
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Prisões acontecem todos os dias. Elas são resultados de mandados expedidos e pautados em uma investigação, ou por meio de flagrantes. Não é novidade para ninguém que a maioria das pessoas que vão para trás das grades são homens. Mas, é o tamanho da diferença na quantidade de detentos do sexo masculino e feminino que chama a atenção. Segundo levantamento do Departamento de Polícia Penal do Paraná (Deppen-PR), realizado a pedido do Portal GMC Online, menos de 5% dos presos das 42 comarcas da Regional de Maringá e Cruzeiro do Oeste são mulheres.

De acordo com o Deppen, ao todo estão presas nesse momento mais de 6.500 pessoas na região de Maringá. Desse número, apenas 283 são mulheres, o equivalente a 4,35%.

Um dos questionamentos que podem surgir é: onde estão as construções que abrigam essas mulheres? Para começar a explicar a localização e funcionamento dessas estruturas carcerárias é importante esclarecer a diferença entre ‘penitenciária’ e ‘cadeia’. A penitenciária é o espaço que abriga presos já condenados pela Justiça. Estes detentos recebem, inclusive, o nome de “presos permanentes”.

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Cadeia Pública de Altônia. Foto: Deppen

Já as cadeias ou presídios abrigam réus com processos sem transitado e julgado, isto é, o julgamento ainda não aconteceu. Essa diferença de significado de penitenciária e cadeia vai além das palavras. Isso porque as penitenciárias são locais projetados para a ressocialização dos presos. No local, são oferecidas atividades laborais, cursos, trabalho com regressão de pena e acesso à educação com preparação do indivíduo para ser reinserido no convívio comunitário, entre outras ações. Já as cadeias deveriam ser de “passagem temporária”, apesar da realidade não ser bem assim na prática.

Penitenciária feminina, o Paraná só tem uma. Ela é de segurança máxima e fica em Piraquara na Região Metropolitana de Curitiba (RMC). As demais unidades são cadeias e estão espalhadas pelo Estado. Em toda a jurisdição da Regional do Deppen há quatro cadeias destinadas a mulheres. Na região da Vara de Execuções Penais (VEP) de Maringá são duas unidades: em Astorga e Alto Paraná; e na região da VEP de Cruzeiro do Oeste outras duas: em Goioerê e Altônia. Há uma média de 80 presas em cada unidade, exceto na de Alto Paraná, que tem cerca de 40 detentas.

Cadeia terá capacidade para até 80 presas
Interior da cadeia de Astorga, que recebe mulheres presas. Foto: Arquivo/Deppen

Rotina e ressocialização das mulheres presas

Saiba como é a vida das mulheres presas na região de Maringá
Foto. Deppen

Apesar de estarem numa unidade prisional que, teoricamente, deveria ser apenas por um curto período de tempo, o coordenador Regional do Deppen de Maringá, Luciano Brito, explica que inúmeras atividades de ressocialização são realizadas nas unidades prisionais da região da Vara de Execuções Penais de Maringá e possibilitam que as detentas fiquem mais próximas do ambiente familiar.

“Em parceria com diversas empresas e órgãos públicos, são ofertadas dezenas de atividades como cursos profissionalizantes, escolarização, incentivo à leitura, apoio psicossocial e até mesmo celebrações religiosas. Ou seja, as atividades são as mesmas ofertadas em uma penitenciária’, afirmou o coordenador regional do Deppen.

Dessa forma, mesmo com a restrição da liberdade, engana-se quem pensa que a rotina das detentas é dominada pelo tempo ocioso. Durante toda a semana são ofertadas ações que vão de trabalho em canteiros até cursos com carga horária que variam de 60 horas até 120 horas, dependendo da complexidade.

A rotina começa bem cedo. Às 6 horas, elas são acordadas e vão para o café-da-manhã. Aquelas que não têm compromisso, logo após comerem seguem para o banho de sol. O restante cumpre agenda: as que estão matriculadas em cursos ou estão fazendo algum nível do ensino fundamental vão estudar, enquanto outras seguem para o trabalho, que pode ser a limpeza da própria cadeia ou a produção de algum material em parceria com empresas. O turno para as que trabalham é de 6 a 8 horas por dia.

Karen, uma das presas da unidade de Goioerê, está detida desde outubro de 2020. No ano passado, ela fez curso de Gestão Empresarial, por meio de uma parceria entre o Deppen e a Igreja Universal, e em janeiro deste ano fez a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Com 498 pontos, ela foi aprovada na prova e conseguiu uma bolsa integral no curso de Educação Física, modalidade EAD, em uma faculdade com polo em Goioerê. “A oportunidade de estudo recebida, a formação no curso técnico e o ingresso na faculdade foram de suma importância em minha vida, pois terei melhor oportunidade no mercado de trabalho. Acredito que tal feito ajudará a diminuir o preconceito da sociedade em relação ao preso egresso”, frisa.

Para a policial penal Vanda Lidorio, gestora da Cadeia Pública (CP) de Astorga, “as presas que trabalham e estudam têm uma melhoria considerável na auto estima e no comportamento”. E o gestor da CP Goieorê, Walter Guimarães, reforça que o trabalho contribui com a ressocialização das detentas: “observamos que com atividades laborativas e apoio da comunidade estamos alcançando bons resultados na ressocialização”.

As presas podem tomar banho à vontade. São ofertadas três refeições diárias: café-da-manhã, almoço e janta. Segundo o Deppen, a comida é servida para todos, incluindo os funcionários. “São empresas terceirizadas que fornecem a alimentação com acompanhamento de nutricionistas. A alimentação que é ofertada para presas é a mesma para servidoras em geral, inclusive para as policiais penais”, afirmou Luciano Brito.

Visitas

Por causa da pandemia, as visitas presenciais estão limitadas. Mesmo assim, existe a possibilidade de fazer uma vídeo conferência. Pode-se receber um familiar uma vez por mês, com tempo de uma a duas horas. Além disso, existem as assistências jurídicas, que é o momento de sanar duvidas e tomar conhecimento da situação processual.

Religiosidade das mulheres presas

A religiosidade passa com facilidade entre as grades que separam essas mulheres do mundo aqui fora. São 4 igrejas que fazem um trabalho que vai além da evangelização. São abordados temas para crescimento pessoal e que aumentam a qualidade de vida como higiene pessoal, poesia, música e dança. Os cultos ofertados são da Igreja Assembleia de Deus, Adventista do Sétimo Dia, Universal do Reino de Deus e a pastoral da Igreja Católica.

Benefícios das mulheres em comparação aos homens

O diretor do Deppen Luciano Brito explica que ocorreram mudanças na lei recentemente e dezenas de presas ganharam a liberdade, o que reorganizou o sistema carcerário feminino.

Atualmente, por determinação de instâncias superiores, mulheres com filhos menores de 12 anos não são mantidas presas. Antes, elas eram encaminhadas para a penitenciária, já que é necessária uma estrutura adequada para atender essas mães que ficam acompanhada dos filhos, principalmente as crianças menores de 2 anos que precisam da amamentação. Hoje, as cadeias da região seguem a mesma rotina e atividades das penitenciárias, mas não possuem a mesma estrutura e qualidade. Só que as mulheres presas até preferem estar em cadeias do interior, pois ficam mais perto de suas famílias.

E dentro desta perspectiva de comparação do número de presos homens e de mulheres presas é importante enfatizar uma nova revisão penal que ficou conhecida popularmente como a “súmula da mulher de Cabral”, que concedeu prisão domiciliar para Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, em 2017. Adriana era acusada de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Só que por ter um filho de 11 anos e outro de 14 que dependiam da acusada, ela ganhou o benefício da prisão domiciliar com base na decisão da ministra Maria Thereza de Assis Moura, do Superior Tribunal de Justiça.

Com base na lei da isonomia, abriu-se a oportunidade para milhares de advogados entrarem com pedidos para detentas que possuem filhos menores de 12 anos. Isso, ajuda a explicar o número pequeno de mulheres presas.

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Cadeia Pública de Goioerê. Foto: Deppen

De acordo com o advogado criminalista Israel Batista de Moura, mesmo que for crime hediondo, as mulheres podem ser beneficiadas por esse entendimento (súmula mulher de Cabral). “E vale destacar, que é preciso ter sensibilidade com as mulheres presas, nossas cadeias não têm a mínima condição de atender muitas delas. Não tem o básico. Até o absorvente, que é item indispensável, muitas vezes não é ofertado”, afirmou o advogado criminalista.

Israel Batista ainda pontua outras situações em que pode se pedir a liberdade da mulher que é investigada por algum crime ou que já tenha sido condenada, “Podemos mencionar a prisão domiciliar em caso de doenças graves como câncer ou aids, pois na cela a mulher não vai estrutura para se cuidar. Outros casos são filhos excepcionais aqui fora ou até um filho doente que necessite dela. Isso não quer dizer que ela ficará isenta de tudo. Só que não ficará efetivamente presa”.

O advogado, que tem mais de 30 anos de experiência, conta que a maioria das mulheres não comete um crime sozinha. Na maioria das vezes, elas são envolvidas pelo companheiro.

“Se pegarem os dados de crimes de mulheres vocês vão ver. A maioria foi ‘mula’, que é aquela coitada que a mando do marido ou por pressão teve que pegar alguma droga e ir levar. Nesse meio tempo foi descoberta e acaba pagando pelo crime de tráfico de drogas. A maioria delas não queriam fazer aquilo, acabam sendo influenciadas ou pressionadas. Se você quer minha opinião, eu sou a favor dessas leis. É difícil você ver um mulher criminosa de verdade”, concluiu.

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