28 pessoas doaram o corpo em vida em Maringá; saiba como doar
A grande certeza da vida é também o maior mistério. Existe vida após a morte? Religião e ciência se implicam na busca por respostas. Há quem tenha o desejo de ser enterrado…há quem prefira ser cremado. Mas você sabia que é possível doar o corpo para a ciência?
No Paraná, a doação de corpos após a morte ou em vida está vinculada ao Conselho Estadual de Distribuição de Cadáveres do Paraná (CEDC/PR). Instituído pela Lei Estadual nº 15.471, de 10 de abril de 2007 e criado pelo Decreto Estadual nº 3.332 de 27 de agosto de 2008, o Conselho atua desde 2009 na distribuição de corpos destinados às Instituições de Ensino Superior do Paraná com a finalidade de estudos e pesquisas.
Segundo a professora e conselheira titular representante da UEM no Conselho, Célia Regina de Godoy Gomes, o primeiro registro de doação de corpo para a UEM foi feito em março de 1999. O segundo foi feito um ano depois, em março de 2000, de Aparecido Rubio de Araújo, que já concedeu entrevista ao GMC Online. “Percebi que poderia ser útil mesmo após a morte, relatou na época o técnico em enfermagem aposentado”.
Até o momento, foram registradas 29 doações para a UEM, sendo 28 de corpos e uma de órgãos. Deste total, três doações foram efetivadas, sendo duas de corpos e uma de órgãos. “Pode ser que dos que não efetivaram sua doação no cartório tenham morrido, porém a família não quis fazer a doação ou não sabia do registro”, explica Celia. O registro mais recente foi feito em fevereiro deste ano.
Por que doar?
Pelo artigo 14 da Lei nº 10.406/2002, “é válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte. O ato de disposição pode ser livremente revogado a qualquer tempo”.
Na maior parte das instituições de ensino superior, o ensino da anatomia é feito por meio da utilização de corpos de pessoas que faleceram e que não foram procuradas por amigos ou familiares. Pela Lei nº 8.501/1992, esses cadáveres podem ser utilizados para ensino e pesquisa.
“A maior parte dos cadáveres que temos na nossa instituição são de pessoas que não foram identificadas e não reclamadas, ou identificadas e não reclamadas. Se após 30 dias da morte, não foram identificados e não reclamados, podem ser doados para uma instituição de ensino superior. Atualmente no Paraná será doado para o CEDC e este doará para uma instituição que esteja cadastrada junto a este conselho. Existe também casos, em que familiares doam o corpo para não terem gastos com o funeral, ou seja, com o enterro. Quando doam para a Universidade a família não terá custo nenhum. Uma vez doado à instituição o corpo está disponível para ser usado no ensino e na pesquisa, a legislação permite”, diz Celia.
Celia destaca que a anatomia é uma ciência e, no seu conceito mais amplo, é a ciência que estuda, macro e microscopicamente, a constituição e o desenvolvimento dos seres organizados. “Ela estuda as estruturas do corpo humano importantes para as ciências médicas, e tem contribuído com os ensinamentos e aprendizagem do corpo humano. Portanto, contribui principalmente para o ensino da anatomia humana para as áreas saúde e biológica, mas também para a pesquisa, para a investigação científica. O ensino da anatomia clássica tem sido realizado em todas as universidades do mundo por meio de métodos de dissecação de peças cadavéricas formolizadas”, explica.
Corpos doados para a ciência contribuem de inúmeras formas. Confira abaixo:
- Permitem que os profissionais de saúde desenvolvam novos procedimentos cirúrgicos, cada vez mais eficientes e menos agressivos e invasivos;
- Contribuem para pesquisas relacionadas, por exemplo, ao conhecimento das variações anatômicas existentes nos indivíduos, ao estudo de alguma patologia que o doador possuía, à descrição de estruturas não totalmente elucidadas até o momento, entre outros;
- Possibilitam a realização de pesquisas relacionadas à antropologia forense, ciência que ajuda a identificar características diferenciais nos indivíduos. Isso contribui, por exemplo, na identificação de corpos em acidentes aéreos, entre outras situações.
- Médicos residentes podem aprender e treinar os diversos procedimentos de saúde que são fundamentais para suas especialidades.
Para onde vão os corpos?
Após serem doados para qualquer instituição de ensino superior, os corpos vão ser preparados para utilização, que consiste em: fixação e conservação. “Para fixação usamos uma substância química (formalina a 10%), que será injetado/perfundido pelos vasos sanguíneos do corpo, para que possa preservar a integridade dos tecidos. Após este processo ele será colocado em tanques que contenham este fixador para que possa ser conservado. Se bem conservado, um corpo/cadáver dura anos. Após bem fixado, depois de aproximadamente 30 dias, ele poderá ser dissecado. Dissecar consiste em cortar, ir tirando as camadas para o estudo regional de cada parte do cadáver. Esta parte da anatomia é denominada de anatomia topográfica. A anatomia é uma ciência e a dissecação é uma técnica para que possamos estudar os corpos”, explica Celia.
Os corpos doados ficam, portanto, armazenados em tanques contendo uma solução de formol ou glicerina, e quando bem conservados e manipulados adequadamente duram anos. Celia explica que o tempo de uso depende de uma série de fatores, como a causa da morte, o tempo decorrido entre a hora do óbito e a preparação do corpo por meio de técnicas de conservação, o manuseio do corpo durante as aulas e pesquisas.
Como doar?
Para realizar a doação de corpo em vida é necessário ser maior de 18 anos. O doador deverá dirigir-se a um cartório, com duas testemunhas e documentos pessoais, para realizar o termo de intenção ou escritura pública. No documento, deve constar que deseja fazer a doação do corpo para fins de estudo e pesquisa para a UEM ou para outra instituição de ensino superior. Após realizar a escritura pública, é necessário levar uma cópia para a instituição que deseja doar. Na UEM, o Departamento de Ciências Morfológicas dará as informações necessárias para a doação.
Segundo Celia, também é possível realizar doação de corpo após a morte, por meio da autorização de familiares. “A família pode fazer essa doação pós-morte em respeito à vontade do falecido. A pessoa pode ter mencionado que gostaria que seu corpo fosse doado, mas nunca efetivou isso no cartório. Ou pode ser que a pessoa não quisesse ser enterrada, ou por motivo religioso. “Os familiares podem doar independente da vontade da pessoa que morreu. Os familiares são soberanos na decisão sobre o corpo. Mesmo não sendo efetivada a vontade em cartório, mas comunicou à família sobre sua vontade, os familiares podem fazer esta doação”, explica a professora.
Não é permitida a doação de corpo em caso de morte violenta ou suicídio, porém a decisão da doação ainda depende da autorização do Juiz ou ministério público.
Para mais informações sobre a doação de corpos para a UEM, clique aqui.