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27 de setembro de 2024

Doação de órgãos: Renascimento e esperança marcam histórias de quem recebeu ou aguarda um transplante


Por Brenda Caramaschi Publicado 27/09/2024 às 08h13
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O Paraná é referência no transplante de órgãos, com mais que o dobro de doações em comparação à média nacional/ Foto: Albari Rosa/AEN

A cada ano, 3 mil pessoas morrem à espera de um órgão no Brasil. Nesse mesmo período, mais de 1, 5 milhão de óbitos são registrados no País – e muitas dessas pessoas poderiam ser doadoras, mas o número dos que efetivamente doam órgãos após a morte ainda é muito baixo frente à necessidade. É o que diz Claudemir Ferreira, presidente da ONG Vidas Gerando Vidas, que incentiva a doação de órgãos, sangue e medula óssea. A entidade existe há seis anos e esse ano fez uma parceria com o Conselho de Segurança de Maringá (Conseg), para aumentar a divulgação da importância da doação. Uma das frentes de conscientização que Ferreia diz ser mais importante é que aquele que deseja ser doador formalize sua vontade, ou registrando em cartório essa decisão, ou conversando abertamente com familiares sobre isso, uma vez que, em caso de óbito, é a família quem tem a palavra final sobre doar ou não os órgãos. 

“Hoje a grande dificuldade é a abordagem. Se você chega com um documento que comprova ‘o seu ente querido, em vida, se declarou doador de órgãos. Você quer atender a vontade dele?’ fica muito mais fácil a família dizer ‘sim’”, afirma o presidente da ONG. Ele quer que o assunto seja levado às escolas, para que as novas gerações tenham uma visão mais desmistificada sobre o assunto. “É a maior prova de amor ao próximo”, afirma.

A parceria com o Conseg busca dar mais visibilidade ao tema. “Estamos planejando divulgação em rodovias, através de parcerias com as polícia rodoviárias estadual e federal, e também a confecção de um gibi falando sobre a doação de órgãos”, diz Fernando Alves dos Santos, presidente do conselho. “Queremos conscientizar tanto as pessoas de dentro das forças de segurança, como a Policía Civil, Militar, Corpo de Bombeiros, quanto também o público m geral usando os canais que elas tem, ajudando na criação de materiais de divulgação e palestras para fomentar a doação de órgãos, medula e sangue, porque a gente entende a importância da doação”, explica.

O Paraná é referência no transplante de órgãos, com mais que o dobro de doações em comparação à média nacional, de acordo com a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos. Mesmo assim, atualmente, 3.992 pessoas aguardam na fila de espera por um transplante no Estado. A maior demanda é por transplante de rim, com 2.222 pacientes. A seleção de um paciente que aguarda por um transplante ocorre com base na gravidade de sua doença, tempo de espera em lista, tipo sanguíneo, compatibilidade anatômica com o órgão doado e outras informações médicas importantes. 

Doação que traz renascimento 

O empresário Gabriel Chiochetta, 39, foi diagnosticado com fibrose cística quando ainda era um bebê. A doença, incurável e progressiva, leva à comorbidades do pulmão. Em 2015 a enfermidade se agravou e ele passou a ter apenas 13% do funcionamento dos pulmões. No ano seguinte, ele passou a precisar receber oxigênio 24 horas por dia. Tarefas do dia a dia, como escovar os dentes ou tomar banho, ele só conseguia realizar com a ajuda da esposa. O transplante era a única solução – e chegou no dia 17 de junho de 2017. 

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“A gente renasce”, diz o empresário Gabriel Chiochetta, ao lado da família, após receber transplante de pulmão. Foto/ Arquivo pessoal

O empresário ficou por um ano em Porto Alegre fazendo reabilitação pulmonar e, depois disso, sua vida mudou por completo. “Hoje consigo subir uma escada, me alimentar, fazer exercícios físicos, tenho uma vida absolutamente normal, e antes era impossível fazer tudo isso”. Esse ano ele completou 12 anos de casamento e há dois anos a família aumentou, com a chegada da filha, Lívia. “A gente renasce. Renascem os sonhos, as expectativas, tudo aquilo que a gente não sonhava mais, você passa a sonhar e acreditar novamente”, relata o receptor.  

A tatuadora Talise Ziober, 36, moradora de Umuarama, ainda espera o renascimento dos sonhos. Ela tem diabetes e passou a ter pressão alta depois da gestação. A combinação, perigosa para o rim, já havia dado sinais de alerta, e a função renal foi caindo ao longo dos anos até que chegou aos 5% de funcionamento. Ela entrou na fila do transplante duplo (de pâncreas e rim) e esperou por dois anos, durante os quais teve várias expectativas frustradas. “O hospital liga para umas dez pessoas que podem ser compatíveis e, quando chega lá, quem tiver mais compatibilidade ‘ganha’. Eles chamam até de concurso. Eu fui chamada 17 vezes e não deu certo”, relembra. A cada chamado, ela precisava ir até Curitiba, lidando com a ansiedade, dela e da filha, e com o desgaste da viagem, voltando para casa frustrada por não ter sido contemplada.

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A tatuadora Talise, ao lado da filha, hoje com 12 anos, espera há anos na fila pela doação de rim./ Foto: Arquivo pessoal

Foi aí que ela decidiu permanecer na fila apenas para o transplante de rim, já que os problemas renais trazem mais restrições do que os cuidados com a diabetes. A nova espera já dura mais de um ano. Enquanto isso, ela precisa passar por hemodiálise três vezes por semana, durante três horas a cada sessão. O cansaço extremo que ela sente por conta do mal funcionamento do rim a impede de trabalhar. “Se mais pessoas tivessem consciência da importância da doação, essa espera e essa angústia seriam diminuídas. Mesmo depois da morte você pode deixar um legado de amor”, suplica Talise. 

E foi esse legado de amor que trouxe nova vida à advogada maringaense Suely Miamoto. Aos 58 anos, ela diz que “morreu” 30 anos atrás, quando teve uma parada cardiorrespiratória causada por problemas de saúde relacionados ao excesso de peso. Aos 28 anos, ela pesava 148 quilos com apenas 1,58m. Suely foi reanimada, voltou a respirar e o coração voltou a bater. “Você quer viver?” foi a pergunta do médico. Ela decidiu que sim e, para isso, passou por uma reeducação alimentar e adotou uma rotina de exercícios físicos que a fizeram perder mais de 70 quilos. Porém, como consequência da diabetes que havia adquirido antes de mudar o estilo de vida, a advogada desenvolveu insuficiência renal. Ela precisava de um transplante. 

Suely fez hemodiálise por três meses, enquanto aguardava na fila por uma doação. Sete anos atrás, no dia 27 de setembro, quando se comemora o Dia Nacional da Doação de Órgãos, ela conseguiu o transplante de rim. Quando ela acordou, após a cirurgia, ouviu outra pergunta decisiva do médico que a acompanhava: “Se você morresse hoje, poderia dizer com sinceridade que você fez tudo o que você quis na vida, ultrapassou seus medos e se arriscou para fazer o que você sonhava?”. Ela respondeu que não. “Então você está tendo a segunda chance. Aproveita”, disse o cirurgião. Depois disso, ela decidiu viver tudo o que não tinha vivido antes. Fez parte de um motoclube, acampou, foi a shows de pagode. “Eu vi que deixei de aproveitar tanto na minha vida, e fui aproveitar”, conta. 

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Suely não sabe o nome do doador de quem recebeu o rim, mas agradece todos os dias à família pela chance que recebeu de viver tudo o que ainda não tinha vivido./ Foto: Arquivo pessoal

Ela não sabe o nome de quem doou o rim que deu a ela a chance de uma nova vida, mas diz que agradece todos os dias à família que tomou a decisão de doá-lo. O doador era um rapaz de 26 anos que morreu em um acidente de moto. “Quando a gente morre, o corpo vai para debaixo de sete palmos de terra ou vira cinzas. Então que tal deixar uma parte de seu ente querido vivo, e com isso salvar vidas? Uma pessoa pode salvar até oito vidas diariamente”, propõe a receptora. A quem ainda está na fila do transplante, como Thalise, que aguarda por um rim, ela diz “nunca percam as esperanças porque Deus é Pai e o seu momento chegará”. 

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