O que vai acontecer com Pablo Marçal?
Antes de responder a esta pergunta, vale uma anterior: o que aconteceu com Marçal para que divulgasse o laudo falso contra Guilherme Boulos? Como ninguém de sua equipe foi capaz de conter a estratégia suicida, ignorando que havia pela frente todo o segundo turno e, por trás, os olhos dos tribunais eleitorais?
Mesmo que sua campanha não acreditasse no êxito da eleição municipal, Marçal poderia ser visto como alternativa para uma direita órfã de Bolsonaro, inelegível para as eleições presidenciais de 2026. Se Marçal e sua campanha não conseguiram pensar nisso, certamente seus adversários pensarão, levando às últimas consequências o desejo de que perca seus direitos políticos e seja descartado das próximas eleições.
Mesmo que Marçal não tenha produzido o laudo, ou seja, que não tenha cometido o crime de falsificação, o TSE possui entendimento de que a divulgação de informação falsa por redes sociais constitui o ilícito de “uso indevido dos meios de comunicação”. O artigo 22 da Lei de Inelegibilidade (LC 64/90), historicamente, servia para coibir conglomerados de mídia de privilegiar seus candidatos preferidos, dando-lhes mais espaço e oportunidades, impactando no resultado das eleições.
De uns anos para cá, o TSE passou a entender que propagação de “desinformação” e “inverdades” nas mídias sociais caracteriza uso indevido dos meios de comunicação. Incialmente, os julgados miravam disparos em massa de mensagens de aplicativos. Em seguida, o TSE começou a entender que falas de candidatos interpretadas como ataques ao processo eleitoral ou à democracia também se enquadravam. E foi assim que o deputado Fernando Francischini foi cassado, em 2021, e Bolsonaro foi tornado inelegível, em 2023.
No caso de Bolsonaro, a questão é ainda mais controversa, pois foi entendido que suas falas impactaram no resultado de eleição que ele não ganhou, o que obviamente é uma contradição. No relatório de julgamento, constaram dois vídeos que tiveram 589 mil e 587 mil visualizações no Facebook e no Instagram, respectivamente. Mesmo havendo 156 milhões de eleitores aptos a votar, a Corte entendeu ter havido impacto significativo nas eleições.
Por aí, percebe-se que a condenação à inelegibilidade por uso indevido de meios de comunicação depende de critérios nada técnicos e é geralmente tomada com enorme exagero pelo TSE, abrindo um campo imenso para que afaste Marçal das eleições de 26. O que o levou a divulgar o laudo, não sabemos. Mas sabemos o que vai acontecer com ele daqui para frente. Será mais um da direita expulso de campo.
Os juízes não podem acreditar que os eleitores não sabem o que fazer com seu voto, e que seja sua função oferecer a eles um cardápio apenas com os pratos que entendem adequados. Se o Judiciário não confia no cidadão, torna-se difícil exigir que o cidadão confie no Judiciário. A democracia plena pressupõe confiança mútua entre povo e instituições. O tumulto gerado por decisões agressivas não é menor, nem melhor, que o gerado por candidatos agressivos.
Sobre o autor
André Marsiglia é advogado constitucionalista, especialista em liberdade de expressão. Formado em Direito e Letras pela USP. Mestre e doutorando pela PUC-SP. É fundador do Instituto Speech and Press. Foi consultor jurídico da Repórteres Sem Fronteiras (RSF). É membro da Comissão de Mídias da OAB, da Comissão de Mídia e Entretenimento do IASP e membro julgador do Conselho de Ética do CONAR. Escreve sobre liberdade de expressão e judiciário, sempre às terças-feiras, no Portal GMC Online
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