A lei Magnitsky não pegou no Brasil?
O Brasil é um país prodigioso em escândalos e inversões de valores. Aqui, um chanceler alemão faz uma crítica pontual à organização de um evento fracassado como a COP30, e nossos governantes transformam a advertência em ataque ao povo, revidando com qualificações grotescas como “fascista” ou “nazista”.

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É também aqui que um ministro sancionado por violações a direitos humanos, como Alexandre de Moraes, consegue posar de defensor de “direitos humanos” nas decisões tomadas na ADPF das Favelas, relacionadas às últimas operações policiais no Rio de Janeiro.
Aqui tudo se coloca de ponta-cabeça, como o mapa-múndi invertido apresentado pelo IBGE em maio deste ano. Essa capacidade de inverter a lógica parece ter alcançado a Magnitsky. Criada para punir violadores de direitos, a lei prevê sanções duras contra indivíduos e sanções secundárias contra empresas que prestem apoio material ou reputacional a eles.
Mas, na última semana, quando o Ministério Público realizou seu 26º congresso, com uma palestra de encerramento do ministro sancionado Alexandre de Moraes e patrocínio de empresas privadas, inclusive norte-americanas, nada disso pareceu se evidenciar. Ficou parecendo que, no Brasil, nada gera receio, tudo pode, e a Magnitsky não “colou”, não “pegou”.
É sabido que o entorno de Moraes sentiu o impacto da lei: familiares e amigos foram atingidos. Socialmente, ele próprio se tornou um personagem incômodo, evitado em clubes e ambientes privados. Mas os EUA aceitarão que, no Brasil, sua toda-poderosa Magnitsky tenha efeito limitado, seja uma “biribinha”, não seja levada a sério e se descredibilize?
Os Estados Unidos, historicamente rígidos na proteção de seus instrumentos legais, tolerarão a tropicalização da Magnitsky? Permitirão que uma lei concebida para enfrentar ditadores se transforme em algo folclórico?
O risco é que a Magnitsky — que não falha na Rússia, na China, na Venezuela ou no Irã — descubra no Brasil sua derrota. E não por força jurídica, mas pela força do nosso velho talento nacional: transformar o absurdo em normalidade e toda lei em piada.
Sobre o autor
André Marsiglia é advogado constitucionalista, especialista em liberdade de expressão. Formado em Direito e Letras pela USP. Mestre e doutorando pela PUC-SP. É fundador do Instituto Speech and Press. Foi consultor jurídico da Repórteres Sem Fronteiras (RSF). É membro da Comissão de Mídias da OAB, da Comissão de Mídia e Entretenimento do IASP e membro julgador do Conselho de Ética do CONAR. Escreve sobre liberdade de expressão e judiciário, sempre às terças-feiras, no Portal GMC Online
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