A Penalidade Materna e os Caminhos para a Inclusão Produtiva das Mulheres no Brasil

Nos últimos anos, temos acompanhado um movimento crescente de mulheres assumindo posições de liderança nas empresas brasileiras. Esse fenômeno, embora encorajador, ainda contrasta com a realidade de milhares de mulheres que, por serem mães — especialmente mães solo —, enfrentam barreiras invisíveis que dificultam não apenas o acesso, mas a permanência e o crescimento profissional no mercado de trabalho. Esta análise nasce não apenas de dados estatísticos, mas também da minha vivência profissional acompanhando a trajetória de diversas mulheres em contextos empresariais variados.
Liderança Feminina: Avanços Visíveis, Desafios Ocultos
É fato que as mulheres brasileiras têm conquistado mais espaço em cargos de liderança. Segundo dados do IBGE e da CNI, em 2023 elas representavam 39% dos cargos de gestão, sendo maioria entre os diplomados em ensino superior. Há uma tendência de que atinjam essas posições cada vez mais cedo, o que reforça sua competência e preparo.
Contudo, na prática, ainda observo muitas empresas tratando essa conquista como um movimento pontual e não como parte de uma política estruturada. A presença feminina na liderança precisa deixar de ser uma exceção admirável e tornar-se parte de um planejamento estratégico corporativo consciente.
Maternidade Solo e Precoce: Onde Mora a Injustiça
O recorte da maternidade revela uma realidade mais dura. A penalidade materna é real, crônica e muitas vezes naturalizada. Estudos da FGV mostram que mulheres com filhos têm 20% menos chance de estarem empregadas do que homens — diferença que chega a 27% no primeiro ano após o parto. Isso me faz lembrar de várias clientes com quem trabalhei, mães solo altamente comprometidas, que encontravam portas fechadas simplesmente por assumirem responsabilidades familiares.
Entre as mães solo, 45% estão na informalidade e 54,3% têm no máximo o ensino fundamental. Mesmo assim, quando inseridas em ambientes de trabalho minimamente estruturados, essas mulheres demonstram resiliência, produtividade e uma ética profissional invejável. Muitas vezes, têm menos escolaridade formal, mas compensam com disciplina, foco e responsabilidade — fatores que, do ponto de vista empresarial, são ativos de altíssimo valor.
Casos de Sucesso: Empresas que Enxergam o Valor Real das Mães
É preciso destacar que há bons exemplos. Empresas como:
Unilever: criou o programa “Mães na Liderança”, com mentorias e indicadores de promoção que reconhecem o esforço de funcionárias que conciliam maternidade e desempenho.
Em todas essas empresas, há um ponto comum: mães são percebidas não como potenciais riscos ou ausências, mas como talentos que, quando apoiados, entregam mais e permanecem mais tempo.
Magazine Luiza: além de políticas inclusivas, desenvolve programas específicos de liderança para mães e oferece suporte concreto como creches internas.
Natura: tem uma cultura voltada para a inclusão, com incentivos ao trabalho remoto e horários flexíveis, além de reconhecer publicamente o papel das mães em cargos de liderança.
Estrutura: O Que Realmente Faz a Diferença?
Durante minha atuação, percebo que as cidades e empresas com mais estrutura — creches acessíveis, políticas de trabalho híbrido, suporte psicológico e planejamento de carreira — são também as que contam com maior oferta de mão de obra feminina qualificada. Quando uma mãe tem onde deixar seu filho com segurança e pode adaptar seus horários de trabalho, ela não apenas permanece no emprego: ela se engaja, cresce e lidera.
É impossível falar em produtividade, inovação e cultura forte sem falar em infraestrutura de apoio às mães. Já acompanhei casos de empresas em cidades menores que, ao não oferecerem qualquer suporte nesse sentido, perdiam constantemente profissionais excelentes por questões logísticas e familiares.
Oportunidade Estratégica: Ações para Empresas e Políticas Públicas
Com base em tudo que vi e vivi, algumas recomendações são urgentes:
- Revisar as políticas internas e garantir que os critérios de promoção não penalizem mulheres com filhos.
- Incluir mentorias específicas para mães, especialmente na retomada pós-licença maternidade.
- Implantar creches internas ou parcerias com instituições locais.
- Flexibilizar horários e incentivar o trabalho híbrido ou remoto onde for possível.
- Capacitar lideranças para reconhecer e valorizar diferentes trajetórias.
Do lado do poder público, é essencial investir em políticas urbanas que viabilizem a presença de mães no mercado: creches públicas de tempo integral, transporte acessível e campanhas de valorização da mulher trabalhadora.
A penalidade materna é um dos principais freios ao pleno desenvolvimento das mulheres no Brasil. Mas ela também é uma chave de transformação. Se empresas e governos encararem essa questão com seriedade e sensibilidade, teremos uma força de trabalho mais diversa, estável e comprometida. As mães — especialmente as mães solo e aquelas com histórias de superação — não são um ônus, são uma aposta segura em produtividade, lealdade e liderança transformadora. Eu já vi isso acontecer, mais de uma vez. E posso afirmar com convicção: apoiar mães é construir o futuro.
