Maior novidade do primeiro Plano Estratégico (2025-2029) sob a presidência de Magda Chambriard na estatal, a volta ao etanol responde a uma série de motivações, que vão da proteção da fatia da companhia em um mercado de combustíveis em transição energética e pela descarbonização em si, mas também inclui fundamentos econômico-financeiros.
O diretor financeiro da estatal, Fernando Melgarejo, disse ao Broadcast que é justamente essa investida que vai permitir à Petrobras garantir o aumento da previsão da taxa interna de retorno dos negócios de renováveis de 8% para 10% – este último porcentual indicado no plano estratégico 2025-2029.
“O retorno esperado (em renováveis) era de 8%. Estamos trazendo para 10% ao mudarmos a visão e incluir o etanol”, diz Melgarejo, que ainda cita as sinergias entre o produto e a infraestrutura da Petrobras, toda voltada aos combustíveis líquidos.
A taxa de retorno é observada de perto – e com certo mau humor – pelo mercado, uma vez que negócios de óleo e gás tem sarrafo bem mais alto, com retorno acima de 22%.
“Todos os negócios de biocombustível ou baixo carbono da Petrobras ainda estão em fase inicial, com pouquíssimas coisas operacionais. Nossa análises são mais rigorosas do que antes. Nenhum projeto passa na governança se não tiver retorno positivo em três cenários, incluindo o pessimista”, continua o diretor da Petrobras.
Sentimento do mercado
Até aqui, o discurso de disciplina financeira tem mantido as expectativas de investidores e analistas sob controle, uma tarefa que tem sido ajudada pela forte distribuição de dividendos no período.
A Petrobras estuda desembolsar US$ 2,2 bilhões em investimentos relacionados à produção de etanol. Se para investidores de longuíssimo prazo com maior foco em indicadores voltados para o Meio Ambiente, Social e Governança o anúncio é positivo, para aqueles focados principalmente em retornos financeiros esse não é o caso, mas está longe de ser a pior opção de investimento: o retorno é maior do que de outros negócios de baixo carbono e tem mercado consolidado.
“O anúncio foi bem recebido não porque a Petrobras deveria estar tomando essa direção sob a ótica de retorno. Não deveria. Se fosse para maximizar retornos apenas, a companhia deveria focar só na exploração e produção de petróleo”, disse ao Broadcast um analista de banco de investimento que preferiu não se identificar. “Mas se, de fato, precisa-se investir mais em combustíveis renováveis por questões ambientais e de sobrevivência no longo prazo, é melhor que ele seja feito em molécula (etanol) do que em elétron (energia eólica offshore)”, complementou o analista.
A fala reflete bem o sentimento de mercado em relação ao tema. A lógica é que o Brasil já tem uma cadeia, rede logística e infraestrutura para a distribuição do etanol.
Em relatório divulgado à época do Plano Estratégico, porém, o Citi manifestou preocupações com o anúncio. “Apesar do potencial aumento da demanda por etanol, não entendemos o investimento da Petrobras no setor novamente, considerando que o foco da empresa é o Upstream (água profunda e pré-sal) e as características de retorno baixo do setor”, afirmam os analistas Gabriel Barra, Pedro Gama e André Cardona, em relatório.
O líder de análises de Óleo, Gás e Petroquímicos da XP, Régis Cardoso, também é cético. Para ele, é importante entender que a forma de operar o segmento de etanol é diferente do setor de petróleo e gás natural. “O sucesso da Petrobras no óleo e gás pode não necessariamente se traduzir em sucesso também no etanol. A experiência passada da empresa mostra que ela foi muito mais bem sucedida em projetos de óleo e gás, com o pré-sal, do que nas iniciativas de biocombustíveis que ela desenvolveu na mesma época. Não necessariamente a Petrobras é o melhor sócio, ou melhor operador para ativos de etanol”, diz.
Para a sócia da KMPG Nelmara Arbex, especializada em sustentabilidade, o etanol é o combustível sem origem de petróleo que mais faz sentido para a infraestrutura brasileira. Para que essa opção ganhe mais tração no mercado, diz ela, é preciso que as grandes montadoras internacionais entendam que essa é uma demanda do País, que tem dimensões e infraestrutura diferente de países europeus que veem hoje em carros elétricos uma opção mais viável.