Doente de amor
Intensamente apaixonado, quase infarta ao saber que a mulher amada irá viajar sem ele. Para a casa da irmã, em vias de separação.
– Como ficarei sem você, ó bala sete belo?
Consolar a coitada.
– Já é maior de idade, não, coração?
Se dependesse dele, impediria o trajeto Maringá-Belo Horizonte. Nem casados são, não vivem juntos. Não são nem mesmo namorados. Mas ele acha que tem argumentos.
– Há uma pandemia, benzinho!
Decidida, ela já sabe que irá. Sem choro, nem vela. Dar um tempo desse grude, homem-atenção: mensagens e mais mensagens pelo WhatsApp – se não for respondido na hora, ele fica paranoico. Ela não aguenta mais.
– Dormir comigo antes da viagem? E se você tiver contaminado?! Vou passar pra minha família.
– Só há uma doença em meu coração…
– ?
– …É o meu amor por você.
– !!!
Ela arruma as malas, consegue uma carona. Chega a pensar em fazer o exame do cotonete, mas desiste. Dinheiro não está sobrando, tem que guardar para reformar o banheiro. Ele queria ajudar, mas ganha pouco. A melhor contribuição é assistir com ela o “Irmãos à obra” no Youtube.
Na noite anterior à partida, implora:
– Apenas um beijo de despedida?
– Não!
Revoltado, decide dar cabo à própria vida.
– Se esse amor não é real, que eu me acabe.
Antes de cometer o pecado que o Espírito Santo não perdoa, abre o Twitter e vê Tiago Iorc nos trending topics. Há uma foto e ele clica na imagem.
– Que eu tivesse morrido antes!
Tenta dormir, não consegue. Seis meses de amor para isso? Não era ela quem prometia mundos e fundos? A viagem ao Paraguai para comprar meias, batatas e pen-drive com duas mil músicas, um poster do Raça Negra na casa futura, maratonas sem fim de “Pesadelo na Cozinha”.
– O nome do nosso filho seria Jacã!

No dia seguinte, o da partida – ai, Deus, lá vai ele –, manda mensagem pelo celular.
– Bom dia, meu bem!
Sem resposta.
– Ela me odeia?
De hoje, não passa. Pensa até em fazer bilhete suicida – desiste. Ela não entenderia a letra, como não entendeu na carta que ele fez no dia do aniversário dela – em que ela chorou não pela missiva, mas de tristeza ao perceber que o ex-marido não mandara felicitações.
O dia se alonga, e nada de mensagens dela. O caminho para a morte é beber. Tem o Tabuleiros, o Bar do Zé, o Atari, o Divina Dose. Preparando para deixar o serviço – Diabo! – lembra dos decretos municipais.
– Me ajuda aí, prefeito?!
Doente de amor, procura remédio na vida noturna, mas não encontra.
– Tá tudo fechado, pô!
Volta para casa. No celular, não há mensagens dela. Pensa em abrir o Twitter, mas acha melhor não.
***
Victor Simião, 26 anos. É jornalista. Fale com o autor pelo victorsimiao1@gmail.com. O cronista está no Twitter e no Instagram. Ele também assina a coluna “Biblioteca CBN“, na rádio CBN Maringá.
