Bruninha, do Sancor Maringá, superou três anos de suspensão por doping antes de chegar ao clube
Paciência, superação e resiliência. Palavras que podem definir uma das fases mais desafiadoras da carreira de Bruna Costa. Meses antes de ser contratada pelo Sancor Maringá para a atual temporada, a levantadora, de 30 anos de idade, voltava a atuar nas quadras de vôlei após cumprir três anos de suspensão por doping.
Bruninha, como é conhecida, vivia o auge da carreira como titular e capitã do Fluminense, quando foi suspensa pela ABCD (Autoridade Brasileira de Controle Antidopagem) em janeiro de 2022. O exame antidoping da atleta, realizado em dezembro de 2021, apontou o uso de duas substâncias proibidas, além de derivados metabólitos: clenbuterol, que auxilia a perda de peso, e oxandrolona, que ajuda no ganho de massa muscular.

Suspensa provisoriamente em 18 de janeiro, momentos antes da partida contra o Osasco pelas quartas de final da Copa Brasil, a levantadora teve a punição definitiva publicada em 7 de fevereiro de 2022. Com pena máxima de quatro anos de afastamento, Bruninha teve a redução para três após admissão de culpa no julgamento.
— A gente estava se preparando para o jogo, chegou a notificação no meu e-mail. Automaticamente eu não poderia mais jogar, então do dia para a noite eu estava no auge da minha carreira, talvez brigando por uma oportunidade na seleção, e depois não podia mais jogar vôlei — relembrou a atleta em entrevista exclusiva ao GMC Online.
A punição seguiu até 17 de janeiro de 2025, após 1.095 dias sem poder atuar profissionalmente no esporte. Bruninha, então, retornou ao Fluminense durante a temporada, até ser contratada pelo Sancor Maringá, em agosto.
Com experiência e liderança técnica dentro do elenco, Bruninha tem sido um dos destaques do time titular, ajudando a equipe a chegar atualmente ao quinto lugar da Superliga. A camisa 2 já contribuiu com 17 pontos em quatro partidas, sendo seis de ataque, sete de bloqueio e quatro de saque.
História virou documentário
Produzido pela jornalista Mari Mendonça, o documentário “Bruninha: Por trás do doping”, disponível no YouTube, relatou os desafios vividos pela atleta nos três anos de afastamento. A série de três episódios teve a participação de familiares, amigos, atletas e profissionais do esporte que trabalharam com a levantadora na época da suspensão.
A produção contou a trajetória de Bruninha até se profissionalizar no vôlei, suas conquistas por onde passou, questões familiares em torno de sua orientação sexual e todo o processo de aceitação da pena até seu retorno às quadras.
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No segundo episódio, a jogadora relembrou suas motivações para se dopar, admitindo que estava ciente da situação e que buscava melhorar o rendimento nos jogos após um quadro de gripe.
— Eu tive uma gripe muito forte no começo de dezembro [de 2021]. Eu ia tomar substância por conta, na verdade ninguém sabia, nem a Flávia, minha esposa, sabia. Por 15 dias ali no fim do ano, eu ia pegar bem a brecha do fim do ano. O antidoping foi dia 22 de dezembro no Fluminense. Então foi assim que aconteceu — disse ao GMC Online.
Bruninha nunca escondeu lamentar e se arrepender de sua decisão, tomada em um momento de ascensão do Fluminense na Superliga daquele ano. Estar no clube carioca, inclusive, era uma das realizações da paulista que viveu por muitos anos em Curitiba, mas sempre sonhou em atuar por um time de massa e viver à beira da praia.
Ela também teve o apoio da família, amigos, treinadores e do clube, que não acobertaram seu erro, mas ofereceram as bases para que ela pudesse retornar.
Os anos de suspensão
Afastada de todas as atividades relacionadas ao vôlei, a levantadora se viu sem rumo não podendo praticar a única coisa que fazia desde a infância. No primeiro ano de suspensão, Bruninha quis ficar longe do esporte, mas não se encaixava ao tentar outras profissões, até que concluiu a graduação de Educação Física e passou a dar aulas, onde se encontrou.
— Eu gostava bastante de dar aula, eu estudei muito nesse período também, aproveitei para me graduar, me pós-graduar, tenho três pós-graduações em periodização e gestão, então aproveitei esse momento para isso.
Antes de se estabelecer novamente, a atleta conta que “chegou ao fundo do poço”. O momento de dificuldade, no entanto, se reverteu em fortalecimento da mentalidade e, principalmente, amadurecimento. Nesta reviravolta, Bruna retomou o amor pelo vôlei e, quando pôde, estava obstinada a voltar aos treinos e ao profissionalismo.
— Foi um momento muito difícil da minha vida, mas que eu tenho certeza que eu precisava passar por isso. Eu amadureci muito como pessoa, a forma como eu enxergo o mundo, a forma como eu lido com as situações, como eu enxergo o outro. Então depois que tudo passou, eu tenho certeza que eu só amadureci e cresci. Foi um momento necessário.
— Desde que tudo aconteceu eu tinha uma meta de que eu gostaria de poder escolher voltar a jogar vôlei ou não quando acabasse minha suspensão. A gente [ela e a esposa] construiu uma empresa muito bem consolidada, então eu tinha uma outra oportunidade que me dava uma segurança financeira muito grande fora da quadra. Quando a suspensão acabou eu pude escolher ou não voltar a jogar vôlei. E claro que eu escolhi, eu amo isso, é o que eu mais amo, sou obstinada por isso.
Aproveitando a vida de educadora física, Bruninha também conseguiu manter sua paixão pelos treinos de academia durante a suspensão. Segundo ela, isso possibilitaria uma volta mais rápida ao ritmo de alto nível, uma vez que a retomada da parte técnica seria menos complicada.
Volta ao Fluminense
Ainda em 2024, restando quatro meses para o fim da punição, o Fluminense procurou a levantadora para voltar a jogar pelo clube. Bruninha, que também recebeu outras propostas, não pensou muito para tomar a decisão, muito por conta do carinho pelo time tricolor e para não abandonar a vida que tinha no Rio de Janeiro, já estabelecida com a família.
— Dei totalmente preferência para o Flu, até por conta daquela história mal terminada, a gente ficou pela metade. Eu tenho um carinho muito grande pela torcida, pelas pessoas que estavam lá. A maioria das pessoas que estavam na temporada que eu retornei me acompanharam quando tudo aconteceu, então eu fiz questão de voltar para lá.
A atleta lembra que teve receio de não ter oportunidades na retomada da carreira, mas considerou que o cenário atual do voleibol brasileiro com a carência de jogadoras na sua posição contribuiu para tal.
— Foi um momento de muita ansiedade. Eu falava “meu Deus do céu, será que eu vou ter oportunidade, vou ter espaço no mercado de novo?”. Mas o nosso vôlei está muito carente de levantador, isso eu tive um pouco de sorte. A gente não tem muitas jogadoras preparadas para jogar em alto nível nessa posição.

A volta oficial aconteceu em em 21 de janeiro de 2025, contra o Sesi Bauru, pela Superliga. Após anos afastada, Bruninha jogou meia temporada longe do ritmo ideal, buscando seu espaço em grupo definido e lutando por uma eventual titularidade. Apesar disso, a jogadora classificou a retomada como “significativa”, principalmente no aspecto mental e de autoconfiança.
Com o fim da temporada, a perda do status de titularidade no Fluminense, que detinha antes da suspensão, fez Bruninha decidir trilhar novos rumos. Anos antes, a levantadora havia trocado o Minas, onde foi vice-campeã mundial sendo reserva, pelo Fluminense, justamente para jogar com regularidade.
— A intenção era ficar no Flu desde o começo, mas com a vinda da Fabíola, o nome, a história que ela tem, eu percebi que talvez eles estavam pensando em mim como reserva. Eu não poderia ficar mais um ano sem jogar. Eu tinha que procurar alternativas para me recolocar no mercado e ter a oportunidade de jogar de novo.
Foi quando, no período de inter-temporada deste ano, Bruninha foi procurada pelo Maringá, equipe treinada pelo velho conhecido Aldori Júnior. Nas categorias de base, a jogadora trabalhou com o treinador em Curitiba.

Chegada à Cidade Canção
Bruna já conhecia Maringá e, além da estrutura da cidade, disse ter sido convencida pelo projeto do Sancor Maringá. A garantia de que passaria a jogar com regularidade também foi uma dos fatores para a vinda. O clube viu a levantadora Vivian se transferir para o Sesc Flamengo e ficar com uma lacuna na posição.
— É um projeto que já conquistou muita coisa, mas ainda está se estruturando, cada ano crescendo mais. O Maringá está nesse caminho de ser um grande projeto da Superliga. Então, quando eu recebi a proposta eu fiquei muito feliz, logo foi minha prioridade vir para cá, e rapidamente a gente tomou essa decisão. Eu coloquei na balança entre jogar e ficar no Rio de Janeiro. Jogar sempre foi minha prioridade, então eu não pensei duas vezes antes de vir para cá. Também tenho grandes amigas aqui, a Gabi [Cândido] jogou comigo desde criança, a Karol [Tormena].
Na sua recepção, a atleta contou ter sentido confiança no seu profissionalismo, apesar do episódio de doping. Toda a situação foi abordada positivamente pelo clube, no que hoje é considerado um tabu, segundo Bruninha, que usa sua experiência para conscientizar outros atletas.
— Eu sempre fui muito aberta em relação a isso, eu assumi, então eu não tenho nada para esconder de ninguém, eu acredito que seja uma página virada. Aqui isso foi muito tranquilo, foi um erro pontual na minha carreira, e eles confiaram no meu profissionalismo. Página virada no sentido que eu sei que isso faz parte da minha história, eu gosto de contar, eu gosto de falar, para conscientizar as pessoas, os atletas. Eu acho que é um tabu hoje na nossa sociedade, dentro do esporte, então a gente tem que falar mais sobre o doping, e aqui no Maringá eu não tive nenhum problema com isso, eles só abordaram de forma positiva, e eu acho que é isso que tem que ser.

Depois de um início promissor na Superliga, com duas vitórias importantes em quatro partidas, a camisa 2 do Maringá acredita que o time tem capacidade de ficar entre os seis primeiros e, posteriormente, alcançar uma inédita semifinal. Ela acredita que sua experiência e liderança, graças às passagens por grandes equipe do Brasil, pode fazer a diferença para a equipe.
— Eu convivi com grandes atletas, treinei em altíssimo nível, eu entendi como funciona o fluxo de um grande time, com atletas muito experientes, muito líderes, Natalia, Gabizinha, Carol Gattaz, Macris. Então eu acho que eu trago muito essa bagagem de liderança mesmo, para ajudar as mais novas, fazer com que elas se sintam confiantes dentro da quadra, trazer a responsabilidade para mim quando preciso, trazer a responsabilidade do erro para mim. Acho que eu estou um pouco mais acostumada a lidar com isso, mais preparada, então acho que isso conta muito, não só essa oportunidade de ter convivido com essas grandes meninas, mas essa questão de feeling e tática do levantador, que eu acho que isso é mais difícil de ser treinado, você tem que desenvolver mesmo, então acho que isso faz toda a diferença.
Sonho com a Seleção
Durante toda a carreira, Bruninha só teve chances com a amarelinha na Seleção Brasileira Sub-23, onde foi campeã do Campeonato Sul-Americano, em 2016. A oportunidade na equipe principal ainda não veio, mas a atleta acredita que as boas campanhas do Sancor Maringá podem colocá-la em evidência, assim como o restante do grupo.
Recentemente, Karol Tormena, Paulina e Vivian, quando ainda defendia o clube, foram pré-inscritas na lista da Seleção para a disputa da Liga das Nações de Vôlei, sob o comando de José Roberto Guimarães.
— Eu tenho esse objetivo individual e acredito que o Maringá seja o time ideal para que eu conquiste, além de estar com um time muito bom, que isso também faz diferença, é uma vitrine muito grande. O Aldori esteve lá [na Seleção Brasileira], ele entendeu como funciona, o que eles estão buscando, acho que isso pode me ajudar também. O vôlei moderno vem se modificando, então os levantadores estão cada vez mais agressivos, a gente vem tentando treinar isso, então aqui é o clube perfeito para que eu conquiste esse grande sonho.
— Eu acordo todo dia pensando nessa oportunidade de Seleção Brasileira. Eu tenho certeza que se aparecer eu vou estar preparada para agarrar.

Nascida em Osasco, Bruna Costa atuou no Barueri, Pinheiros, Minas, Curitiba e Fluminense antes de defender o Sancor Maringá.
Em 14 anos de carreira, a levantadora ostenta um título da Superliga (2018-19), um da Copa Brasil (2019), um do Campeonato Mineiro (2018), além de ser bicampeã do Sul-Americano de clubes (2019 e 2020), todos pelo Minas. Pelo Fluminense, conquistou o Campeonato Carioca em 2024.
