“O amor é arriscado, mas sempre foi assim. Há milhares de anos as pessoas se buscam e se encontram”, escreveu Paulo Coelho. Só faltou combinar com a última palavra da frase, que se perdeu na história da maringaense que vamos contar nesta reportagem especial. Isso porque o encontro nunca existiu. Miriam perdeu o gosto pela vida por um bom tempo. Ficou em silêncio durante 5 anos, e agora, decidiu falar.
“As feridas ainda estão vivas, são parte das minha história, ficarão para sempre aqui. Aprendi a conviver com elas, e quero alertar outras mulheres a não passar pelo que passei”, afirmou.
Foram apenas 4 meses de um relacionamento a distância, 120 dias de trocas de mensagens, declarações de amor, promessas, envios de dinheiro e muita, mas muita mentira. Essa teia de ações e sentimentos custaram R$ 125 mil a maringaense e uma depressão profunda. Ela caiu no “Golpe do Amor”.
Para preservar a vítima não vamos identificá-la, decidimos chamá-la pelo codinome Miriam. Aos 67 anos, solteira e mãe de dois filhos, uma mulher bonita e inteligente achava que não havia mais tempo para o amor. Porém, numa terça-feira, Miriam decidiu instalar um aplicativo de relacionamento. Começava aí uma longa história de sofrimento.
No aplicativo, Miriam conheceu um homem, que se identificou como Kelvin. Ele se apresentou como engenheiro petrolífero, disse que era inglês, tinha 57 anos e duas filhas, mas que era divorciado e estava a procura de um grande amor…. e também de ajuda. Os dois começaram a trocar fotos e emails.
Um detalhe interessante: Kelvin se negou a repassar o número de telefone e o WhatsApp para Miriam. Ele dizia que a empresa não permitia. O contato entre os dois só era feito por email. Ou seja, a vítima nunca ouviu a voz e nem a imagem real, daquele que, na verdade, era um golpista. Por email, o homem enviava fotografias que supostamente dele: algumas trabalhando, em viagens e com a família. O homem era gentil, atencioso e demonstrava muito carinho.
“Ele falava que eu era uma pessoa adorável, uma mulher educada, amorosa. Foi se aproximando e, com o tempo, falou que estava apaixonado. Eu achei estranho isso tão rápido e tão longe, mas a conversa foi indo. Ela me falava tudo o que uma mulher quer ouvir”, disse.
A medida que Kelvin ganhava a confiança de Miriam, começaram a aparecer os pedidos de ajuda. O suposto engenheiro afirmava que estava em alto mar, próximo à costa oeste da África, e que o navio estava sendo atacado por piratas.
“Ele falava que o comandante ordenou que a tripulação retirasse todos os pertences. Ele dizia que tinha joias, documentos de imóveis em São Paulo, dólares, objetos e quem não tinha ninguém para mandar. Como pegou confiança em mim, iria mandar tudo para eu retirar no Brasil” afirmou.
Pedidos de dinheiro
Mas, para retirar as bagagens, Miriam precisava pagar taxas alfandegárias. O “golpe do amor” entrava na fase de captar o dinheiro. Outras pessoas da quadrilha começaram entrar em contato com a vítima.
“Entrou em ação um tal de John Marc de uma empresa de valores, aí ele pediu meu celular e começou a ligar passando dados de pessoas que eu tinha que depositar e o valor que eu tinha que pagar. O primeiro depósito que eu fiz foi R$ 2.420, uma taxa da alfândega. Depois disso, ele foi ligando dizendo que tinha mais taxas, taxas de vários tipos para pagar para a liberação, eu só sei que eu fui pagando e fazendo depósitos e depósitos, de R$ 5.420, de R$ 8 mil, o maior foi de R$ 47 mil”, lembra a vítima.
Quando percebeu, ela já tinha enviado R$ 125 mil aos golpistas. “Eu fiz consignado no Banco do Brasil, eu tirei dinheiro na Caixa, do Cheque Especial, da Poupança, foi tudo, tudo mesmo”.
A descoberta
O dinheiro dos contas dos bancos acabou, não havia mais de onde tirar. Miriam, então, começou a pedir dinheiro emprestado para parentes, o que levantou a suspeita dos filhos. Eles começaram a investigar e entraram em contato com o Aeroporto de Guarulhos.
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“Eles entraram em contato com o servidor da alfândega em Guarulhos e ele informou que era um golpe, que era uma quadrilha de nigerianos e que várias mulheres, todos os dias, ligavam para lá querendo saber dessa encomenda que tinha chegado. Mesmo assim, eu demorei a acreditar, eu cheguei a mostrar os documentos que me enviaram para a minha filha dizendo: ‘olha aqui, é verdade’, mas minha filha disse: ‘mãe é golpe, a senhora se envolveu muito com isso’. Só depois caiu a ficha”, afirmou a vítima do “golpe do amor”.
Estrago na vida
Assim que Miriam se deu conta que tinha caído no “golpe do amor”, procurou a Delegacia de Estelionatos e registrou um boletim de ocorrências. Ela ainda descobriu a existência de mais vítimas que caíram no mesmo golpe. Uma delas, moradora da capital paulista a convenceu de fazer uma denúncia no Ministério Público de São Paulo. Miriam foi ao MP, e com a ajuda de outras vítimas, contribuíram com as investigações. Elas descobriram o verdadeiro nome de Kelvin, além do endereço dele. Ele chegou a ser ouvido, mas foi liberado.
“Eu fiquei muito envergonhada por ter caído num golpe como esse, mas infelizmente a gente cai, porque eles têm uma lábia incrível, e fazem isso com muita facilidade. Eu não tenho esperança de reaver o dinheiro. Isso já faz 5 anos. Isso já prejudicou bastante a minha vida, a vida da minha família. Mas como tudo tem que continuar, eu estou me mantenho firme contando essa história para servir de exemplo para outras pessoas”, finalizou.