Dois casos de adoção à brasileira ganharam repercussão no Paraná recentemente. São histórias de paranaenses que descobriram na fase adulta a adoção ilegal e foram atrás dos pais biológicos. E a repercussão destes casos trouxe à tona outras histórias semelhantes.
É o caso do ouvinte da CBN Fábio Vicentin, que após ouvir a reportagem sobre o tema entrou em contato. Ele descobriu que foi adotado aos 13 anos e nunca conseguiu encontrar os pais biológicos. Até encontrou uma irmã biológica, que também foi adotada e sabia da adoção, mas não se tinha mais informação.
Fábio sempre teve um forte vínculo de afeto com os pais adotivos e não guardou mágoas, mas reconhece que seria importante conhecer a própria origem. Fábio desconfiava que era adotado e um dia perguntou para a mãe.
“Eu perguntei para minha mãe, do nada, quem que era minha mãe e ela se apavorou. Ela estava cortando a minha unha e deixou a tesoura cair no chão e começou a chorar. E aí ela chamou o meu pai e falou: ‘Ele já sabe de tudo’. Aí, naquela hora, tipo, travei. Diz ela que ela pedia sempre para Deus para eu descobrir de uma maneira tranquila, que ela não tinha coragem de contar. Mas depois, quando eles me chamaram e me contaram, aí eu comecei a ligar algumas coisas, porque mesmo criança, quando a gente brigava entre os primos, alguma coisa assim, uma vez mesmo minha prima falou ‘ah, esse bastardinho e tal’, mas eu nem sabia o que era isso. Mas depois as coisas começaram a cair. Depois que eles me falaram, eu praticamente fiquei ali uns 30 dias chorando, todos os dias. Eu entendi meus pais pelo que já havia acontecido com eles. Eles já tinham pego uma criança e a mãe se arrependeu, foi lá e buscou de volta. Então, o receio que eles tinham era isso. Que eu crescer e sair nessa busca e eles acabarem me perdendo. E depois que eles me pegaram, 30… 90 dias depois, minha mãe ficou grávida da minha irmã adotiva e eles tiveram o filho deles. Pelo carinho, pelo amor que eles me deram, não tive falta. Mas todos nós queremos saber de onde a gente veio. Isso é natural”, contou Fábio.
Quem adota uma criança de forma ilegal pode incorrer em crime. Os critérios para a adoção legal estão previstos no Estatuto da Criança do Adolescente (ECA), e o processo é mediado pelo Ministério Público e autorizado pelo Judiciário. Como explica o promotor de Justiça da Infância e Juventude, Ricardo Malek.
“Para adotar uma criança, não basta ter vontade de disputar e condições financeiras para tanto, o que era comum antigamente. O ato, ele envolve uma enorme responsabilidade. E o papel do Ministério Público e da Justiça é garantir que os adotantes tenham um compromisso sério com o recebimento de uma criança ou de um adolescente em sua família. Que eles estejam preparados para esse momento, fornecendo um ambiente seguro e acolhedor para o novo filho ou nova filha. A única forma de adotar uma criança com segurança é seguir os trâmites previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. Então, quem tem interesse deve ingressar com um pedido de habilitação para adoção no Juízo da Infância e Juventude da sua comarca. Durante esse processo, vão ser apresentados documentos e, além disso, a pessoa interessada ou casal passa por avaliações psicológicas e sociais para garantir que está apto para criar um ambiente saudável para a criança, para que ela possa crescer, se desenvolver, de forma a ter seus direitos respeitados. E a habilitação, inclusive, ela tem um prazo de validade. Então, a cada três anos é necessário fazer uma revalidação dessa habilitação para verificar se essas condições se encontram ainda presentes no caso. E isso ocorre justamente para evitar que pessoas despreparadas ou que não entendem o que é o processo de adoção façam. Que se aproximem de crianças e adolescentes que estão em uma situação de vulnerabilidade por serem postos em uma situação de risco aí por familiares que entregavam ilegalmente as crianças para quem não era pai, quem não era mãe. E as pessoas que recebem as crianças podem até achar que estão fazendo um ato de caridade para isso”, explica Riardo Malek.
O promotor ainda comenta sobre a conduta correta para pais que adotam um criança ou adolescente legalmente. “O importante é que os pais tratem a questão com transparência. Até porque o Estatuto da Criança e do Adolescente garante ao adotando o direito de conhecer sua origem biológica a partir dos 18 anos de idade. Então, essa história, se ela for uma história escondida da criança ou não for revelada, ela pode gerar uma quebra no vínculo construído com o adotando”.
Quem entrega um filho à adoção mediante recompensa e quem registra em cartório como seu o filho de outra pessoa, cometem crimes previstos em lei.
“A promessa ou entrega de um filho para terceiro mediante pagamento ou recompensa é um crime previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente e com uma pena prevista de reclusão de 1 a 4 anos e multa. E a responsabilidade é tanto da mãe ou dos pais biológicos quanto dos terceiros que recebem a criança. E logo em seguida, se quem recebe a criança comparece em cartório e registra como seu filho de outra pessoa, responde pelo crime previsto no artigo 242 do Código Penal, que estabelece uma pena de reclusão de 2 a 6 anos. Então, em caso de condenação, nós temos aqui uma pena mínima de 3 anos de prisão para quem pratica essas condutas”, esclarece o promotor.
A prescrição do crime de falsificação do registro civil começa a correr quando o caso se torna conhecido.
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