27 de março de 2025

Araucária 700 anos que tombou durante temporal no Paraná é clonada; entenda


Por Redação GMC Online Publicado 24/03/2025 às 15h22
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Equipe da Embrapa Florestas (PR) conseguiu clonar uma araucária (Araucaria angustifolia) de cerca de 700 anos que tombou durante um temporal no Paraná, um feito inédito na pesquisa florestal brasileira. A árvore, com 42 metros de altura, era considerada a maior do estado da espécie, que é um símbolo da paisagem local. O projeto de resgate genético resultou em mudas clonadas que foram plantadas em Cruz Machado, cidade onde a árvore original estava.

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Foto: Prefeitura de Cruz Machado

A clonagem de uma planta tão antiga apresentou grandes desafios, pois a regenerabilidade de tecidos de árvores idosas é reduzida. No entanto, o pesquisador conseguiu produzir quatro mudas de tronco, preservando o DNA da árvore original. “Resgatar uma araucária tão antiga e cloná-la com sucesso é uma conquista científica”, comemora o pesquisador da Embrapa Ivar Wendling.

Por serem originárias de tecidos adultos, as mudas clonadas irão originar árvores de porte menor mas que começam a produzir pinhão mais cedo do que uma árvore convencional, o que pode beneficiar produtores rurais interessados no uso sustentável da espécie. O pinhão, além de ser um alimento tradicional, tem valor comercial crescente e pode representar uma fonte de renda adicional para agricultores.

No entanto, Wendling alerta que as mudas ainda são delicadas e requerem cuidados especiais nos primeiros anos de desenvolvimento, incluindo irrigação e controle de competidores naturais. “A árvore original sobreviveu por séculos, mas essas mudas precisam de atenção para que possam crescer saudáveis e continuar esse legado”, explica.

A clonagem

A técnica usada para esta clonagem foi a enxertia, que consiste em unir um fragmento da planta original a uma muda jovem. No caso da araucária clonada, logo que a árvore caiu foram coletados brotos (foto á direita), que foram então enxertados em mudas já estabelecidas, garantindo que o novo indivíduo possua o mesmo material genético da planta original. Esse processo permite a regeneração da árvore a partir de suas próprias células, mantendo características como resistência e produtividade.

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Foto: Kátia Pichelli

O enxerto pode ser feito a partir de brotos do tronco ou do galho da árvore, resultando em diferentes formatos de plantas. As mudas de tronco tendem a crescer como árvores convencionais, enquanto as de galho originam as chamadas “mini araucárias”. Os dois tipos produzem pinhões mais precocemente. Após a enxertia, as mudas passam por um período de crescimento antes do plantio definitivo em campo.

No caso de árvores idosas, a clonagem é mais difícil devido à baixa capacidade de regeneração dos tecidos mais velhos. Com o passar dos anos, as células das plantas, reduzem sua taxa de multiplicação e perdem parte de sua capacidade de originar novos indivíduos.

Além disso, árvores muito antigas possuem um sistema hormonal diferente do de plantas jovens, o que pode dificultar o crescimento dos enxertos e reduzir o sucesso da clonagem. No caso desta araucária, com idade estimada em cerca de 700 anos, o pesquisador da Embrapa precisou realizar experimentos para identificar as condições ideais de cultivo das mudas clonadas. O sucesso do procedimento representa um avanço na tecnologia florestal, abrindo caminho para a conservação genética de outras árvores centenárias.

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Foto: Kátia Pichelli

Clones plantados em locais simbólicos

O plantio das mudas ocorreu em dois locais distintos. Uma delas foi levada de volta à propriedade rural de Terezinha de Jesus Wrubleski (foto acima), onde a araucária original estava. “Fico muito feliz de poder ter essa nova árvore aqui, como uma filha da antiga”, comemora Wrubleski (veja vídeo abaixo). Segundo ela, a antiga araucária atraía visitantes interessados em sua imponência, e a nova muda representa uma continuação dessa história. “Minha família já está há mais de 70 anos nessa propriedade e a araucária era parte da nossa família. Agora, poderemos mostrar a sua ‘filha’”, conta. Outra muda foi plantada no Colégio Agrícola de Cruz Machado, em um evento com estudantes, professores e autoridades locais.

A escolha do colégio agrícola como local para receber a muda reforça a importância da educação na conservação da biodiversidade. Para o diretor da instituição, Anilton César Michels, a presença da araucária servirá como ferramenta didática para os alunos. “Esse é um momento histórico para nossa escola e para a cidade”, afirma. Segundo o diretor pedagógico da instituição, Anderson Kaziuk, o plantio incentivará os alunos a desenvolver o cultivo da araucária em suas propriedades, consorciado com a erva-mate, diversificando a produção e gerando renda para a agricultura familiar. “E o processo de acompanhar o crescimento dessa araucária vai ser único, não é mesmo?”, complementa Kaziuk.

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Foto: Kátia Pichelli

Para os estudantes, a oportunidade de acompanhar o crescimento de uma árvore clonada é uma experiência única. “Quero voltar daqui a alguns anos para ver como ela está e quem sabe colher alguns pinhões”, diz o aluno Reginaldo Litka. A professora Ana Carolina Majolo reforça que o aprendizado sobre a araucária pode mudar a percepção dos alunos sobre o uso sustentável da floresta. “Antes, muitos viam a árvore como um empecilho. Agora, entendem que ela pode ser um recurso valioso”, explica.

A técnica de clonagem utilizada pelos cientistas permitiu a produção de mudas a partir de brotos de tronco, garantindo que a nova geração mantenha a genética da árvore original. Diferente das mudas geradas por sementes, que podem resultar em árvores geneticamente variadas, as mudas clonadas preservam características únicas da planta mãe, como por exemplo o  formato dos pinhões época de produção. Além do plantio das mudas, os estudantes do colégio agrícola participaram de uma palestra sobre a importância da araucária na biodiversidade e seu potencial econômico para a agricultura familiar. A espécie, que já cobriu grandes extensões do Sul do País, hoje está ameaçada pela exploração descontrolada realizada no passado. “Precisamos encontrar formas de preservar a araucária e, ao mesmo tempo, torná-la economicamente viável para os produtores”, ressalta Wendling.

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Foto: Kátia Pichelli

O prefeito de Cruz Machado, Carlos Novak, reforça o valor simbólico do projeto: “Essa árvore faz parte da história do nosso município. Hoje, aprendemos a conservá-la e a usá-la de forma sustentável”. O secretário de Agricultura da cidade, Daniel Waligura, complementa: “A madeira da araucária já foi usada para construir casas, mas agora ela também pode ser um ativo econômico vivo”.

O projeto também prevê a doação de uma das mudas clonadas para o Governo do Estado do Paraná e a preservação de outra na coleção genética de araucária da Embrapa Florestas, garantindo a continuidade das pesquisas sobre a espécie. “Essa árvore tem um DNA único e precisamos estudar o que a tornou tão resistente”, conclui Wendling.

As informações da Embrapa.

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