Mercado da região é condenado a indenizar jovem acusado de furtar chinelos; entenda


Por Redação GMC Online

O juiz de Marialva, Devanir Cestari, na Comarca de Maringá, aceitou o pedido de indenização por danos morais em ação que envolveu um jovem de chinelos de dedos, comprados pela mãe dias antes, e um supermercado da cidade.

Foto: Reprodução/Unsplash

A fiscal do supermercado abordou o rapaz, que estava com os amigos, depois de uma partida de futebol, pagando compras no caixa do supermercado. De acordo com os depoimentos colhidos no processo, a fiscal perguntou ao cliente se os chinelos que usava tinham sido furtados da prateleira, já que ele levava as chuteiras embaixo do braço.

“A abordagem de qualquer cliente somente se justifica se houver fundadas suspeitas de alguma ilegalidade, o que absolutamente não ocorreu porque nem mesmo havia mero indício de furto, à exceção da predileção de se abordar, sem maiores cutelas e critérios, jovem de cor escura e pobre, já que se desconfia que, se fosse o contrário  (aparência de rico, bem- vestido e branco ), possivelmente isso jamais teria ocorrido”, argumentou o juiz na sua decisão. 

A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR) tem entendido que se deve indenizar por dano moral quando o exercício regular de um direito é exacerbado e atinge a esfera personalíssima do ofendido. 

A decisão se fundamentou, portanto, no conceito de dano moral  como fator punitivo e como  desestímulo à continuidade de práticas semelhantes, como citado por Caio Mário Pereira ( Responsabilidade Civil, atualizador: Gustavo Tepedino, 10.a ed., rev. e atual., Rio de Janeiro: GZ, 2012, pp. 413-414 ) ao apontar que, “ na reparação por dano moral, estão conjugados dois motivos, ou duas concausas: I) punição ao infrator pelo fato de haver ofendido um bem jurídico da vítima, posto que imaterial; II) pôr nas mãos do ofendido uma soma que não é o pretium doloris, porém o meio de lhe oferecer a oportunidade de conseguir uma satisfação de qualquer espécie, seja de ordem intelectual ou moral, seja mesmo de cunho material, o que pode ser obtido ‘no fato’ de saber que esta soma em dinheiro pode amenizar a amargura da ofensa e de qualquer maneira o desejo de vingança. A isso é de acrescer que na reparação por dano moral insere-se a solidariedade social à vítima.”

Honra e respeito à dignidade

Para justificar a indenização por dano moral, a decisão do juiz de Marialva também se baseou na  lição de José de Aguiar Dias (Da responsabilidade Civil. São Paulo: Renovar, ed. 2006, p.ág. 1009-/1010 ),  para quem o dano moral “consiste na penosa sensação da ofensa, na humilhação perante terceiros, na dor sofrida, enfim, nos efeitos puramente psíquicos e sensoriais experimentados pela vítima do dano”. Além disso, a decisão também cita Antônio Jeová Santos  (O dano Moral Indenizável, Ed. Método, 3a. ed., pp. 75 e ss., com base em Jorge Mosset Iturraspe –-Responsabilidad Civil, p. 21 ) lembrando que “todo ato que diminua ou cause menoscabo aos bens materiais ou imateriais, pode ser considerado dano”, acrescentando que o “dano é um mal, um desvalor ou contravalor, algo que se padece com dor, posto que nos diminui e reduz; tira de nós algo que era nosso, do qual gozávamos ou nos aproveitávamos, que era nossa integridade psíquica ou física, as possibilidades de acréscimos ou novas incorporações.”. 

O magistrado seguiu também a doutrina do dano moral como lesão que “ocasiona um distúrbio anormal na vida do indivíduo; uma inconveniência de comportamento ou, como definimos, um desconforto comportamental a ser examinado a cada caso”, como explica Sílvio de Salvo Venosa (Direito Civil – Responsabilidade Civil. – 5a. ed. São Paulo : Atlas, 2005, p. 47). Foi citado tambéem  Sérgio Cavalieri, que o caracteriza como “a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar” (Programa de responsabilidade civil, 2,a ed., SP: Malheiros, 1998, p. 78, apud Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade civil, 8.a ed., SP: Saraiva, 2003, p. 549-/550).   

A decisão, portanto, se baseia na compreensão de que a honra e o respeito à dignidade humana devem ser considerados diante de fatos cotidianos, como comportamentos considerados grosseiros, especialmente nas relações de consumo e considerando fatores sociais e étnicos. 

Com informações do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

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