PÍLULAS: SHAZAM!, CAPITÃ MARVEL, DUMBO
O filão de super-heróis é uma mina de ouro para Hollywood. Descobriram isso há mais ou menos uma década, tanto que o público é bombardeado, em média, com 3 a 4 filmes estrelados por heróis que saem das páginas de HQs e ganham as telas de cinema. Em 2019, não será diferente.
Por conta disso, esta edição do Pílulas traz breves comentários sobre os dois primeiros super-heróis que abriram a porteira para a manada (Vingadores e companhia) passar. E ainda comento sobre “Dumbo”, o primeiro live action da Disney de alguns que virão no decorrer deste ano.
Com a avalanche de filmes de super-heróis lançados nos últimos anos, o público ficou bem acostumado com o perfil das histórias, pois geralmente seguem um molde de introdução, desenvolvimento, conflito, clímax e o vilão derrotado. Para não ficar tão repetitivo – embora, em essência, a maioria seja –, os realizadores passaram a introduzir uma abordagem específica para fortalecer a identidade de cada personagem na telona. Ora o filme é mais sombrio, ora é apresentado com forte veia cômica. Com “Shazam!”, a DC acertou em cheio na escolha do tom que beira a ingenuidade, posicionando-se como um bom exemplar para ser apreciado por toda a família – o que é relativamente incomum para filmes de super-heróis, que quase sempre deitam e rolam na violência grandiloquente. “Shazam!” sai na frente por ser agradável e despretensioso.
Com experiência no gênero do terror, o cineasta David F. Sandberg surpreende na condução da trama, equilibrando gags funcionais, principalmente na gradativa descoberta que o herói adquire de seus superpoderes, com uma parcela de afeto e demonstração do que é ter uma família que podemos confiar. Sem soar piegas, o filme faz uma boa dosagem de ambas as medidas e entrega um resultado caloroso e festivo. Muito deste êxito se deve à dupla protagonista: Zachary Levy está super confortável e claramente se divertindo no papel do brutamontes com mentalidade pré-adolescente, e a química que divide com o ótimo Jack Dylan Grazer, no papel de seu irmão adotivo, é de sair faísca.
Até então, com “Mulher-Maravilha” colado na rabeira, pode-se afirmar com tranquilidade que “Shazam!” é o melhor filme do universo DC.
O primeiro filme solo de uma heroína da Marvel Studios chegou com relativo atraso, mas chegou na voadora. Alcançando a marca de 1 bilhão de dólares na bilheteria mundial, “Capitã Marvel” só comprova o que “Pantera Negra” e o já citado “Mulher-Maravilha” provaram no ano passado: é possível lucrar com uma superprodução protagonizada por uma minoria. Não dá mais pra chamar de “sorte” diante dos fatos. Há público interessado em, de alguma forma, se ver representado na tela do cinema. E isso é louvável. Entretanto, se colocar os três filmes em uma régua comparativa, a Capitã naufraga junto de seu navio.
“Capitã Marvel” é um filme ok. Ancora-se na tão reproduzida fórmula quadrada de apresentação de personagem: a origem, quem é, de onde veio e para onde vai. Junto a toda essa novidade, atulha os inevitáveis conflitos da trama. É uma pena que o roteiro escrito a 10 mãos se engasga e demonstra dificuldade em avançar com a história atropelada, transparecendo gordura e momentos de estagnação.
A irregularidade do roteiro e a direção pouco efusiva do casal Anna Boden e Ryan Fleck são compensados pela dramaticidade de boas cenas isoladas e pelos esforços do elenco em cena, que nos faz comprar toda a ideia. Vencedora do Oscar, a atriz Brie Larson veste a armadura da Capitã Marvel com convicção e esbanja naturalidade no papel. As atuações coadjuvantes de Annette Bening, Samuel L. Jackson como o Agente Fury e, sobretudo, a revelação Lashana Lynch também valem a menção.
No mais, é um filme mediano e bem menos progressista do que vinha se autoproclamando. Seu principal problema é a falta de articulação. E a melhor coisa, sem dúvidas, é o felino Goose, que rouba todas as cenas que se faz presente.
Não é de hoje que a Disney, talvez sem criatividade para novas histórias, vem reciclando seus desenhos clássicos com versões live action, ou seja, com atores reais, de carne e osso. Seguindo o caminho de “Cinderela” (2015), “Mogli, o Menino Lobo” (2016) e “A Bela e a Fera” (2017), chegou a vez do simpático elefantinho voador, “Dumbo”. Visualmente, o filme é irrepreensível, com caprichado design de produção, efeitos visuais convincentes – a criação digital do próprio Dumbo e suas feições merecem reconhecimento – e uma fotografia em sintonia para sublinhar a beleza dos cenários. Entretanto, o principal motor da animação original de 1941 é o drama comovente do pobre animal, desprezado por todos e que literalmente dá a volta por cima. Quanto à potência emocional, esse novo “Dumbo” peca pela apatia.
Não é a minha intenção fazer comparações entre os dois filmes, já que clássico não se mexe, mas a versão atual, dirigida por um Tim Burton no piloto automático, se preocupa muito mais com os desdobramentos do artista circense (Colin Farrell) e sua família face à ganância do vilão sem graça e pouco ameaçador (Michael Keaton) do que com Dumbo em si. Sentimos falta de Dumbo no filme que leva o seu nome. O elefantinho é tratado, infelizmente, como coadjuvante dentro de seu próprio filme.
Decepcionante, “Dumbo” é sem brilho e nunca decola. Depois do que cometeu em “Alice no País das Maravilhas” (2010) e naquela sequência medonha, a Disney deveria largar mão de Tim Burton na direção de suas produções. Sei que a princípio parece uma boa ideia considerando o seu repertório artístico, mas hão de convir que três mancadas seguidas são suficientes para concluir que a ideia não é das melhores.