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21 de novembro de 2024

O capital


Por Elton Tada Publicado 11/10/2022 às 20h51 Atualizado 19/10/2022 às 11h07
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fonte: pixabay

Que a sociedade está rachada, todo mundo sabe. As fissuras são elementos altamente perceptivos. O que talvez não se saiba tão bem são os motivos do racha, as razões pelas quais a sociedade se divide em polos opostos. A divisão, eu ousaria dizer que é uma característica própria do ser humano, sendo que ela se expressa nos mais diversos níveis, por exemplo, na divisão que há dentro do próprio sujeito e na sua dificuldade de aceitar-se e comportar-se como integralidade, passando pelas divisões familiares, de trabalho e de ideologia.

            Acontece que nós vivemos em um mundo que é como é, sem sabermos ao certo o quanto moldamos esse mundo e o quanto somos moldados por ele. Rousseau, importante filósofo francês, acreditava que as paixões naturais da criança deveriam ser reprimidas para que se impusessem nela as lógicas sociais. No cristianismo, o pecado é condição contaminante originária, de forma que temos inclinações ao pecado, mas devemos sempre vencê-las. Marx acreditava que a força da união dos operários, que tem nada ou muito pouco a perder, poderia mudar a forma como se organiza a riqueza no mundo, e os ambientalistas pensam que com a conscientização de cada um, podemos salvar a natureza de sua ampla e devasta destruição.

            A questão é que essa é uma ciência pouco exata, que nem sempre leva em consideração os detalhes e acredite, os detalhes constituem parte significativa do que somos. Somos o resultado de anos de educação formal e muito de educação informal. Somos traumas da infância, da adolescência e da vida adulta, amores e desamores, vitórias e decepções, somos a possibilidade de sermos no mundo. O que não nos pode fugir é que alguns elementos nos cortam com força de espada e precisão cirúrgica, ou seja, algumas coisas nos separam mais do que outras.

            Quando percebemos que não nascemos na família real, e que padre algum colocará uma coroa em nossas cabeças, partimos para o plano B, começamos a jogar o jogo que nos resta, e é por isso que construímos nosso império particular, tudo aquilo que alocamos sob a sombra de nossa posse. Desde que a primeira pessoa ergueu a primeira cerca e afirmou empoderado “isso é meu”, surgiu no mundo a guerra das monarquias individuais, em que não se pretende lutar com o que se é, mas sim esconder ao máximo o que se é utilizando como escudo aquilo que se tem.

            O que se tem, a posse, o capital, é o escudo usado para defender o que há de mais frágil em nós, a ameaça de sermos reconhecidos como aquilo que somos em nossa intimidade. As duas coisas que mais escondemos são nossos medos e nossos amores, pois com nossos medos alguém pode nos dominar e com nossos amores alguém pode nos lesar. Por isso existe um monte de adultos que se identifica como amante de casas e carros, roupas e calçados, viagens e lifestiles. São coisas que se domina, que se vê, se possui, e que sobretudo cabe no feed do instagram. Não fossem essas distrações, as pessoas se odiariam e odiariam seus destinos, perceberiam que não são monarcas de coisa alguma e que suas marcas no mundo são fraquinhas de tudo.

            É por isso que a fissura sempre aumenta. O rico vê no pobre a ameaça de sua própria pobreza e nela o fantasma da insignificação. O pobre vê no rico a opressão que sofre, a mesma que marcou a pele e a alma de seus antepassados. Em alguns casos, que nada tem a ver com a terceira via, o rico pode odiar o rico e o pobre pode odiar o pobre, mas isso só indica o óbvio, que não há na política o princípio do amor.

            O amor é difícil. Bem mais difícil do que se pensa, do que se fala, do que ouve. Buda e Jesus alertaram sobre isso. Mas ninguém quer ser Buda, e ninguém quer ser Jesus. Tomo mundo queria mesmo ser o dono da coroa.

Pauta do Leitor

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