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18 de maio de 2024

A nova juventude frugal: escolhas e consequências


Por João Ricardo Tonin Publicado 15/02/2024 às 09h27
 Tempo de leitura estimado: 00:00

O termo “frugal” se tornou moda entre os jovens no Brasil e no mundo. Viver com menos, moderar o consumo e ter uma vida simples está sendo uma das escolhas da juventude atual. A justificativa é que não é mais interessante trabalhar tanto para ter dinheiro para comprar “coisas” que não são tão necessárias, ou seja, moderar os hábitos de consumo para depender menos do salário e consequentemente levar uma vida mais saudável e ter maior tempo para curti-la.

Happy joyful friends talking and laughing
A nova juventude frugal: escolhas e consequências. Foto: Freepik

Para avaliarmos melhor este tema, eu gostaria de voltar e avançar algumas décadas e ver os principais desafios que essa nova tendência pode gerar. Pra começar eu gostaria de resgatar uma frase muito dita por nossos pais e por nós: “Eu vou dar aos nossos filhos o que eu não tive”.

Essa retórica fortemente verbalizada cria um movimento de pêndulo entre as gerações, ou seja, o que aconteceu no passado não irá ocorrer no futuro imediato, mas poderá retornar daqui algumas décadas.

Para boa parte das famílias brasileiras, é comum nossos avós e bisavós terem vivido na zona rural, nossos pais vivido entre a área rural e urbana e nós estarmos vivendo em uma cidade. É comum também agora retomar a visão, “pô, morar no campo é legal, nos afasta dos problemas da cidade e nos leva para uma vida mais tranquila”.
Veja, no exemplo supracitado, ir para a cidade era tudo o que uma geração queria e agora voltar para o campo ou para uma cidade do interior pacata passa ser uma forte escolha novamente. Meu sentimento é que estamos buscando há gerações por essa vida tranquila que está longe de chegar e o que está acontecendo agora é basicamente mais um movimento deste pêndulo estrutural.

A segunda reflexão é sobre a poupança que as gerações entregam para as próximas. De forma direta, o que nós recebemos hoje de opções de bens e serviços são fruto de um forte esforço feito pelas gerações anteriores, seja por meio do trabalho braçal ou pela tecnologia.

Se você tem Méqui na sua cidade, agradeça o êxodo rural e o forte crescimento urbano de algumas regiões do país. Neste local, a produção de escala (além de outras forças econômicas) criou centros poderosos de consumo e oferta, os quais viabilizaram a entrada de grandes empresas. Se você hoje tem acesso a muitas opções de produtos tecnológicos, agradeça a abertura comercial e financeira da década de 1990, que permitiu no Brasil a entrada de muitos produtos produzidos internacionalmente.

Resumindo, as gerações anteriores trabalharam forte para construir um grande mercado consumidor, que se tornou viável para a oferta de grandes marcas mundiais. Não podemos também deixar de destacar o grande desenvolvimento dos centros logísticos e de distribuição, que são também frutos da poupança de gerações anteriores. Ou seja, a geração atual está desfrutando da poupança criada pelas gerações anteriores.
Então eu lhe pergunto, qual é a poupança que esta geração frugal irá deixar para as gerações futuras?
Uma dos conceitos fundamentais da economia é que o rendimento real só e não somente pode aumentar se houver aumento de produtividade. Se as pessoas começarem a ganhar mais produzindo a mesma coisa sempre, a inflação virá e colocará novamente o salário real no seu devido lugar.

Simplificando, você só pode ganhar mais se produzir mais.

Para ganhar mais, há duas principais opções: A) maior carga horária de trabalho ou B) entregar mais.
Então no futuro só vamos ter crescimento do salário real se as hipóteses A e/ou B forem cumpridas, né? Então por conceito já podemos descartar a hipótese A, os jovens não querem ter uma carga horária maior, então vamos para a B, será que eles estão estudando e se desenvolvendo para merecer um salário maior? Digo merecer, por causa da discussão acima: se ganhar mais para fazer a mesma coisa, o bicho papão da inflação vem e toma o que não é seu.

Vou trazer alguns dados aqui para te ajudar nesta questão…

Hoje no Brasil, 35,9% dos jovens de 18 a 24 anos não estudam e nem trabalham (popularmente chamados de nem-nem ou NEET). Entre os países da OCDE, atualmente ocupamos a segunda posição, ficando somente atrás da África do Sul. Mas qual é a explicação para isso?

Segundo a OCDE este problema possui várias causas: qualidade da educação ofertada, aderência do conteúdo programático com os problemas reais, questões culturais, mercado de trabalho etc.
No relatório da instituição divulgado recentemente (material completo), em alguns países como a Holanda, Alemanha e Suíça, é comum os jovens estarem no mercado de trabalho atuando em uma atividade similar à sua área de estudo.

Para o OCDE, não podemos deixar os jovens se afastarem dos estudos e/ou trabalho.

“É essencial prevenir que os jovens se tornem NEET e minimizar o tempo passado sem emprego, educação ou formação. Os jovens que são NEET não apenas perdem oportunidades imediatas de aprendizado e emprego, mas também sofrem com os efeitos de longo prazo (OCDE, 2022).

Estes dados resumem um pouco da nossa realidade: 1 em cada 3 jovens não estudam e não trabalham. Muitos outros estão no mercado de trabalho, mas estão optando por trabalhar menos e ter uma vida mais tranquila.
Hoje a tranquilidade se resume em uma cesta de consumo muito restrita. Alimentação, mobilidade, entretenimento e habitação (casa dos pais). Amanhã novos produtos entram nesta cesta: filhos (para aqueles que escolherem ter), saúde e aposentadoria.

Como normalmente a maior capacidade remuneratória é desenvolvida entre os 30 e 50 anos, aqueles que escolherem pela vida frugal vão ter poupança suficiente para ter uma velhice tranquila? Haverá poupança a ser deixada para a futura geração ou ela terá que se virar sozinha?

Muitos defendem que a tecnologia deixará os produtos mais baratos e consequentemente aumentar a qualidade de vida, mesmo que não haja crescimento do salário real no longo prazo. Eu acredito que não será bem assim. Por exemplo, o primeiro celular Iphone custava $600 dólares quando foi lançado, há 15 anos atrás, hoje está em torno de $ 1.800 dólares, 3 vezes a mais.

A escolha por uma vida mais frugal tem que colocar na balança as variáveis de hoje e do futuro, principalmente as relacionadas a nossa vida na aposentadoria. Não dá para apostar nossos melhores anos de vida em um futuro que não controlamos.

Se você se acha frugal, mora com os pais ou depende de algum parente, creio que não está levando o conceito a sério. Digo até que sua frugalidade só é possível a partir da poupança criada por gerações anteriores a sua.
O mundo está ficando velho, as tecnologias não estão dando conta de produzir o que consumimos, os insumos estratégicos estão ficando escassos… Todas as tendências indicam que a mão de obra cada vez será mais demandada e minha aposta é que a trend frugal times está com os dias contados.

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